Banco Central mantém Selic em 13,75% ao ano

Pressões políticas não intimidam equipe de Campos Neto

Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Por Bruno Andrade

O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) manteve a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 13,75% ao ano. A decisão foi divulgada em comunicado do BC nesta quarta-feira (22).

A decisão foi em linha com a expectativa do mercado, que espera um corte de juros apenas a partir do segundo semestre. De acordo com o mais recente boletim Focus, a Selic deve encerrar o ano em 12,75% ao ano.

A taxa de juros está nesse patamar desde a reunião de agosto de 2022. O BC começou a subir juros em março de 2021 com o objetivo de controlar a inflação. Na época, a Selic estava em 2% ao ano.

A autarquia enfrenta duas pressões atualmente, a econômica e política. Enquanto a meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3,25%. O Focus estima que o IPCA deve encerrar o ano em 5,95%. O consenso do mercado é que para trazer a inflação para a meta, os juros devem ficar onde estão.

Do outro lado, há uma pressão política. O patamar de 13,75% ao ano é considerado elevado pelo presidente da república, que exige uma redução imediata da taxa. “A primeira coisa que eu acho absurda é a taxa de juros estar a 13,75% num momento em que temos o juro real mais alto do mundo, num momento em que não existe uma crise de demanda, não existe excesso de demanda”, argumentou Lula em entrevista ao site Brasil 247.

O líder petista também lamentou não poder demitir o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. “Eu não posso demitir porque isso depende muito do Senado”, disse. A fala do chefe do Executivo remete à lei de autonomia do Banco do Central, aprovada no governo de Jair Bolsonaro, que só permite a exoneração do presidente do BC com o apoio de 41 senadores, número difícil de ser alcançado.

Segundo analistas, uma redução dos juros só seria possível se o governo apresentasse um arcabouço fiscal crível e imediato. A divulgação da proposta fiscal foi adiada.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou na terça-feira à noite que o anúncio será feito após a viagem que ele fará juntamente com a Presidência da República e empresários neste final de semana.

Embora o lançamento da regra fiscal que irá substituir o Teto de Gastos tenha sido adiado pelo presidente Lula, que o orientou na sexta-feira a trabalhar a articulação política antes da divulgação, o titular da pasta disse hoje estar tranquilo em relação à área técnica dos quatro ministérios econômicos com os quais se reuniu e a Casa Civil.

“Fizemos uma reunião hoje com três ministérios — Gestão, Inovação, Planejamento e Fazenda —, fechamos os detalhes pedidos na reunião de sexta-feira. Estamos alinhados e, agora, nós vamos prosperar, fazer chegar ao conhecimento do presidente da República os detalhes que ele pediu”, afirmou.

Veja o comunicado na íntegra:

Desde a reunião anterior do Comitê de Política Monetária (Copom), o ambiente externo se deteriorou. Os episódios envolvendo bancos nos EUA e na Europa elevaram a incerteza e a volatilidade dos mercados e requerem monitoramento. Em paralelo, dados recentes de atividade e inflação globais se mantêm resilientes e a política monetária nas economias centrais segue avançando em trajetória contracionista.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores mais recentes de atividade econômica segue corroborando o cenário de desaceleração esperado pelo Copom. A inflação ao consumidor, assim como suas diversas medidas de inflação subjacente, segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação. As expectativas de inflação para 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus se elevaram desde a reunião anterior do Copom e encontram-se em torno de 6,0% e 4,1%, respectivamente.

Na mesma linha, as projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* elevaram-se para 5,8% em 2023 e para 3,6% em 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 10,2% em 2023 e 5,3% em 2024. O Comitê optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente, referente ao terceiro trimestre de 2024, cuja projeção de inflação acumulada em doze meses situa-se em 3,8%. Em cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo de todo o horizonte relevante, as projeções de inflação situam-se em 5,7% para 2023, 3,3% para o terceiro trimestre de 2024 e 3,0% para 2024. O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; (ii) a incerteza sobre o arcabouço fiscal e seus impactos sobre as expectativas para a trajetória da dívida pública; e (iii) uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma queda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local; (ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, em particular em função de condições adversas no sistema financeiro global; e (iii) uma desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária.

Por um lado, a recente reoneração dos combustíveis reduziu a incerteza dos resultados fiscais de curto prazo. Por outro lado, a conjuntura, marcada por alta volatilidade nos mercados financeiros e expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária.  O Comitê avalia que a desancoragem das expectativas de longo prazo eleva o custo da desinflação necessária para atingir as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. Nesse cenário, o Copom reafirma que conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas.

Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos de 2023 e, em grau maior, de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

Considerando a incerteza ao redor de seus cenários, o Comitê segue vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que mostrou deterioração adicional, especialmente em prazos mais longos. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza e Renato Dias de Brito Gomes.