Por Reuters
Depois de reunião com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva registrou o desagrado do Brasil com instrumentos adicionais que a UE tenta incluir no acordo com o Mercosul e podem trazer sanções ao Brasil.
“Expus à presidente Von Der Leyen as preocupações do Brasil com o instrumento adicional ao acordo apresentado pela União Europeia em março deste ano, que amplia as obrigações do Brasil e as torna objeto de sanções em caso de descumprimento”, disse o presidente em declaração à imprensa.
“A premissa que deve existir entre parceiros estratégicos é a da confiança mútua e não de desconfiança e sanções. Em paralelo, a União Europeia aprovou leis próprias com efeitos extraterritoriais e que modificam o equilíbrio do acordo. Essas iniciativas representam restrições potenciais às exportações agrícolas e industriais do Brasil”, complementou.
O cerne do desagrado brasileiro é uma “side letter“, um instrumento apresentado pelos europeus que endurecem regras ambientais a serem cumpridas pelo Brasil e que, se não forem, podem levar a sanções europeias. De acordo com fontes do Itamaraty, o desagrado é com o conteúdo e com a forma. A side letter é um instrumento diplomático usado para pedir esclarecimentos em uma negociação de acordo, mas foi apresentado pelos europeus para fazer exigências.
Sobre o conteúdo, o governo brasileiro reclama que os europeus querem tornar obrigatórios compromissos climáticos voluntários assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris, como redução de emissões.
A interpretação do Brasil é que as exigências foram desenhadas no governo de Jair Bolsonaro e os europeus devem rever o tom ao saber que o atual governo tem outro viés e um comprometimento real com a redução do desmatamento. Uma reunião dos negociadores dos dois lados este mês, em Buenos Aires, terá o tema como ponto mais difícil, apesar de Von der Leyen ter dito, na mesma declaração à imprensa, que a UE quer ouvir o Brasil.
“De fato enviamos uma carta, um instrumento adicional, e queremos muito ouvir sua resposta, ouvir você, porque nossa abertura é para ouvi-los. Queremos saber como dar um passo em direção a um acordo. Somos parceiros estratégicos e temos que trabalhar para enfrentar desafios globais”, disse a presidente da Comissão Europeia.
Outro tema que vem emperrando uma solução próxima são as compras governamentais que, há duas semanas, o Brasil anunciou que estava retirando da mesa, o que foi reafirmado agora por Lula. “A Europa e os EUA voltaram a reconhecer, após ciclos de liberalismo exagerado, a importância da ação do Estado em políticas industriais. Programas bilionários de subsídios foram adotados nos países desenvolvidos em favor da reindustrialização”, disse Lula.
“O Brasil, que sofreu um grave processo de desindustrialização, tem ambições similares. Por isso, o Brasil manterá o poder de conduzir as políticas de fomento industrial por meio do instrumento das compras públicas”, continuou.
Sempre um ponto de contencioso nas negociações, que levam mais de 20 anos, as compras governamentais foi uma questão em que o governo Bolsonaro cedeu para tentar acelerar o fechamento do acordo. “Temos a ambição, ambos, de fechar esse acordo o mais rápido possível, o mais tardar no final deste ano. Eu acredito que há enormes vantagens para os dois lados”, disse Von der Leyen.