Arcabouço fiscal ainda precisa ter seus parâmetros definidos, diz Haddad

Haddad afirmou também que levou três nomes para que Lula escolha dois para as diretorias do BC

Agência Brasil
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Por Gustavo Machado da Costa, Sheyla Santos e Stéfanie Rigamonti

O projeto de arcabouço fiscal está pronto do ponto de vista do modelo, mas ainda precisam ser definidos os parâmetros — limites e metas de gastos, de arrecadação e endividamento —, informou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entrevistado na sexta-feira pela CNN Brasil.

Após ter recalibrado as expectativas sobre aprovação da reforma sobre consumo ao indicar na sexta-feira que a matéria não deve passar no Congresso no primeiro semestre, Haddad disse nesta segunda que a proposta deve ser votada no Senado somente entre setembro ou outubro.

Haddad se recusou a dar mais informações sobre o texto, pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não teve acesso ao projeto.

O ministro disse à Mover que detalhes técnicos como os parâmetros e os gatilhos para o controle de despesas relacionados à conclusão do projeto de novo arcabouço fiscal só serão apresentados após a definição do presidente Lula.

Na sexta-feira, o Scoop informou que, mesmo após ter passado por aprovação na Fazenda e por outros ministérios da área econômica, o texto da nova regra fiscal que irá substituir o Teto de Gastos ainda não possuía um gatilho para a redução de despesas públicas em caso de frustração de receitas.

As fontes, na ocasião, afirmaram temer que a ausência desta previsão no novo arcabouço fragilize o texto. Hoje, Haddad afirmou à Mover que são esses os pontos a serem definidos por Lula. “Só poderei falar sobre isso depois de aprovado pelo presidente.”

O chefe da Fazenda, contudo, deu “dicas” sobre a forma como foi construído. Haddad citou problemas relativos à Lei de Responsabilidade Fiscal, a qual chamou de pró-cíclica, e do Teto de Gastos, inexequível. A partir disso, explicou que o arcabouço busca acompanhar a relação entre dívida e Produto Interno Bruto, mas que não terá uma meta para essa métrica.

“Não posso colocar uma meta de dívida porque isso poderia conflitar com um momento de necessidade de uma política monetária contracionista”, afirmou Haddad.

O Scoop publicou que o projeto ainda carece de um gatilho para controlar as despesas, o que pode minar a credibilidade do projeto. Questionado especificamente sobre isso, Haddad tergiversou e citou uma má transição de governo por conta das atitudes do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“Lula, por ser sua meta de vida, não deixará faltar dinheiro para combater a fome. Por isso, estamos retomando programas que foram encerrados e tivemos que recompor as despesas”, afirmou. “O que me foi pedido era retomar os gastos para o patamar de 18,7% do PIB.”

O ministro, que foi entrevistado na sexta pela CNN Brasil, acredita que os interesses de estados, municípios e setores econômicos vão convergir em torno da reforma. “Estamos colocando condições que vão ajudar a todos. Ninguém aguenta mais o ICMS, todos precisam de segurança jurídica”, afirmou.

Segundo ele, o coração da reforma será a implementação do Imposto de Valor Agregado para substituir impostos mais complexos, como o ICMS, o PIS e a Cofins, além de equilibrar a carga tributária pelos diferentes setores.

Haddad apontou que “os governadores são os mais interessados na reforma”, e que se reuniu com prefeitos das grandes cidades, que ficaram também convencidos do modelo proposto. O ministro afirmou que o Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados irá, até maio, apresentar uma versão híbrida das Propostas de Emenda à Constituição 45 e 110.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse nesta segunda-feira que o governo está conseguindo vencer as resistências de governadores e prefeitos em relação à reforma tributária por meio da “boa comunicação”.

“Confio muito na nossa capacidade de convencer”, afirmou. Durante evento em Brasília organizado pelos jornais O Globo e Valor Econômico, Haddad citou um receio por parte dos líderes municipais em relação ao imposto sobre serviços, mas afirmou que tem mostrado aos prefeitos que o impacto previsto por eles nesse setor com a reforma tributária não é tão significativo.

Haddad também falou em um período de dez mandatos, ou 40 anos, para redistribuição de receitas dos municípios. “As coisas estão bem calibradas”, disse.

O ministro também voltou a frisar que a reforma tributária será neutra do ponto de vista arrecadatório e, contrariando falas do secretário extraordinário da reforma tributária na Fazenda, Bernard Appy, disse que é difícil mensurar o impacto das mudanças sobre o Produto Interno Bruto.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse nesta segunda-feira à Mover que detalhes técnicos como os parâmetros e os gatilhos para o controle de despesas relacionados à conclusão do projeto de novo arcabouço fiscal só serão apresentados após a definição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

BANCO CENTRAL

Haddad afirmou também que levou três nomes para que Lula escolha dois para as diretorias de Política Monetária e de Fiscalização do Banco Central. “Um tem perfil acadêmico, outro técnico e outro de mercado. São nomes com condições de subsidiar decisões do Copom”, afirmou.

O ministro reiterou que ainda pode enviar mais nomes para Lula, uma vez que a comissão do Senado responsável para sabatinar o indicado ainda não foi instalada.

Questionado sobre se as falas de Lula contra a condução da política monetária prejudica o país por elevar as expectativas de inflação, Haddad falou que é “necessário olhar mais para os fundamentos da economia do que para o que Lula fala”.

Em sua avaliação, a lei de autonomia do Banco Central, que garante que Roberto Campos Neto comandará a autoridade monetária até 2024, não foi aprovada no melhor momento por conta da polarização que antagoniza Lula e Bolsonaro. “Acredito que depois de aprovada a lei de autonomia, todo o corpo técnico do Banco Central deveria se abster de ter posições políticas” — uma clara crítica a Campos Neto por manter relacionamento com ex-ministros de Bolsonaro.

Bolsonaro, inclusive, seria o responsável por atrasar a queda da taxa básica de juros no país, na visão de Haddad. Segundo ele, desonerações e aumentos de gastos promovidos no segundo semestre de 2023 deterioraram as expectativas e prejudicaram os efeitos da política monetária.

“Empresários estão sofrendo com rolagem de dívida custando 20%, tendo um déficit de pelo menos 6% por conta da escalada dos juros”, disse. “A queda dos juros estava programada, mas por conta do populismo de Bolsonaro não aconteceu.”

AMERICANAS

Caracterizada com fraude pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o caso Americanas poderá “ensejar uma legislação mais dura” por conta dos desdobramentos sobre o mercado de crédito e impacto sobre a economia brasileira.

“Eu sou o maior interessado em saber o que aconteceu na Americanas. Que foi fraude, não tenho a menor dúvida”, afirmou.

Segundo ele, o caso impactou o mercado de crédito, a condução da política monetária e outros aspectos da economia. “As suspeitas são legítimas. É preciso apurar até onde vão as responsabilidade dos sócios.”

LEI DAS ESTATAIS

Haddad também criticou a lei das Estatais, a qual teria tido sua aprovação de forma açodada no Congresso Nacional, em 2016. Segundo Haddad, a lei restringiu demais nomeações e impedem que bons nomes sejam indicados.

“Falavam até do Aloizio Mercadante no BNDES, que ele coordenou campanha de Lula por ter escrito o programa de governo na Fundação Perseu Abramo. Ele possui décadas de experiência”, comentou.

CASO SILICON VALLEY BANK

Após dizer que passou o fim de semana em contato com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para discutir a crise gerada pela quebra do Silicon Valley Bank, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse nesta segunda-feira que o caso SVB não deve causar uma crise sistêmica.

Durante evento em Brasília organizado pelos jornais O Globo e Valor Econômico, Haddad afirmou que as informações disponíveis ainda não são suficientes para que se entenda o tamanho do problema nos Estados Unidos, mas disse que não se tratar de um caso semelhante ao do Lehman Brothers, cuja quebra veio acompanhada do abalo sistêmico no mercado financeiro em 2008.

“O SVB não é um banco de primeira linha, é um banco regional, que atua muito no Vale do Silício, e que tem uma carteira descasada”, afirmou o ministro conforme informações que recebeu de especialistas.

Ainda assim, disse que, em caso de um cenário problemático no exterior, o Brasil está preparado, dada a governança robusta do sistema bancário brasileiro. “Os bancos do Brasil cumprem acordo de Basileia com folga”, disse em referência a parâmteros mundiais de liquidez e responsabilidade para as instituições financeiras.

Haddad afirmou ainda que as projeções de inflação no Brasil estão “bem comportadas”, e disse que, após o governo apresentar as novas regras fiscais, haverá gordura para o início do corte da taxa básica Selic.

“Se acertármos a mão no arcabouço fiscal, ele terá impacto maior que meta [da inflação]”, declarou. O ministro disse que o novo marco fiscal está fechado e que ele vai se reunir hoje com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) para tratar do assunto e, depois, irá apresentar a proposta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Estou pronto para levar a Lula”, declarou.

Sobre o mercado financeiro, o ministro argumentou que os operadores deveriam olhar mais para os atos do governo em si, do que aos ruídos políticos.

COMBUSTÍVEIS

Os combustíveis fósseis podem ser mais onerados no âmbito da reforma tributária, com o objetivo de beneficiar usinas de etanol, enquanto renováveis como energia eólica, solar e hidrogênio podem ter regime especial com incentivos do âmbito da reforma tributária, disse nesta segunda-feira o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).

Haddad explicou, durante evento em Brasília organizado pelos jornais O Globo e Valor Econômico, que a oneração de produtores de combustíveis fósseis, como gasolina e diesel, deve acontecer por meio do imposto seletivo.

Na sexta-feira, o coordenador do Grupo de Trabalho da reforma tributária na Câmara, deputado Reginaldo Lopes (PT), disse em entrevista exclusiva à TC Mover que o imposto seletivo tem como base a questão da saúde pública e do meio ambiente. Nesse sentido, pode-se chegar à conclusão de que cabe o imposto seletivo no setor petroleiro pela “questão ambiental do petróleo fóssil para fazer transição renovável”, disse.

Lopes, contudo, deixou claro que as discussões no GT da reforma ainda são muito incipientes e é preciso abrir o debate com os setores, para entender o impacto da reforma tributária em cada um deles. “E ainda precisa ver se é justificável ou não o imposto seletivo”, afirmou.

O parlamentar destacou ainda a importância de construir um diálogo para entender a alíquota de equilíbrio que deve ser aplicada para cada setor, sem resultar num aumento da carga tributária, algo que é o fundamento da reforma.

Mas Haddad garantiu hoje que haverá a seletividade de imposto na reforma tributária sobre consumo “para contemplar externalidades”.

O ministro disse que a reforma tributária deve ser votada no Senado entre setembro e outubro e atrelou o início da tramitação da proposta no Congresso a um entendimento com governadores em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Haddad disse que o governo tem conseguido vencer as resistências de governadores e prefeitos em relação à reforma. “Confio muito na nossa capacidade de convencer”, afirmou.