Política e economia pressionam Copom, que deve manter juro alto por fiscal e inflação

O principal interesse na decisão dessa quarta-feira estará em relação à indicação futura do Copom

Agência Brasil
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Por Felipe Corleta

Uma verdadeira queda de braço deve marcar a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central desta quarta-feira, com pressões baixistas para os juros vindas de uma crise de crédito e de uma eventual política monetária em países desenvolvidos menos agressiva. Em contraponto, as autoridades lidam com a persistente desancoragem das expectativas de inflação e a nebulosidade em torno da política fiscal no país.

Se por um lado o Brasil convive com a maior taxa real de juros do planeta e perspectivas agudas de desaceleração da economia, por outro as expectativas de inflação e a incerteza em torno do novo arcabouço fiscal advogam pela manutenção da taxa Selic em 13,75%.

Para economistas consultados pela Mover, o principal interesse na decisão dessa quarta-feira estará em relação à indicação futura do Copom, com bancos e analistas se dividindo em torno do momento em que o BC começará um esperado ciclo de cortes nos juros com vistas a evitar uma recessão econômica na maior economia da América Latina.

Desde dezembro de 2022, a expectativa para a inflação brasileira de médio prazo, para 2025, subiu de 3,00% – centro da meta perseguida pelo Banco Central – para 3,90%, sinalizando uma desancoragem das projeções de inflação diante de uma perspectiva de expansão fiscal pelo novo governo.

Com vistas a reancorar as expectativas da inflação e do endividamento do governo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vem travando a sua própria queda de braço: a apresentação do novo marco fiscal. Previsto para ser apresentado antes da decisão desta quarta-feira, o novo conjunto de regras que substituirá o falido Teto de Gastos enfrenta oposição das alas políticas do governo Lula.

Em entrevista ao Portal 247 nesta terça-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que “quer mostrar responsabilidade fiscal”, mas que a apresentação do novo arcabouço ficará para abril, após o retorno da viagem que fará para a China. Há um entendimento de que a postergação representa uma derrota para Haddad, que em evento com agentes do mercado financeiro havia prometido que a nova regra viria a público em março.

Na sua decisão de fevereiro, o Copom pontuou que vê um risco de alta para a inflação na “ainda elevada incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais que implicam sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos”. O Copom pontuou que a conjuntura é “particularmente incerta no âmbito fiscal”. Alterações nestes trechos do comunicado serão decisivas para compreender se o BC mudou ou não o seu plano de voo.

Na Ata da última decisão do Copom, o Banco Central deu uma mensagem que foi vista como uma sinalização positiva para o governo, ao apontar que “alguns membros notaram que a execução do pacote apresentado pelo Ministério da Fazenda deveria atenuar o risco fiscal e que será importante acompanhar os desafios na sua implementação”. Desde então, a agenda de Haddad pouco avançou. O ministro conseguiu uma reoneração apenas parcial dos combustíveis para fortalecer a arrecadação, mas ainda não conseguiu revelar seu plano de regra fiscal.

Outro ponto que pode alterar a decisão de política monetária no Brasil é o comunicado do banco central americano, que sairá às 15h00 desta quarta-feira, horas antes do anúncio do Copom. Uma eventual postura mais branda da política monetária pelo Federal Reserve poderia conversar com uma sinalização de que o Copom estaria pronto para antecipar o ciclo de corte de juros diante dos riscos de uma recessão econômica global.

Vinte instituições financeiras consultadas pela Mover esperam pela manutenção da Selic em 13,75%. Os bancos, fundos e casas de análise consultadas divergem em quando que o BC iniciará um ciclo de cortes na Selic, variando de maio de 2023 até abril de 2024.

O Santander Brasil pontua que uma mudança na estratégia monetária e nas sinalizações futuras do Copom seria prematura neste momento, diante da falta de evidências sobre o impacto de uma desaceleração global de crédito e da piora de expectativas de inflação.

O chefe de estratégia macroeconômica do banco, Maurício Oreng, avalia que o comunicado do comitê pode dar mais peso à desaceleração da economia e aos eventos financeiros externos no balanço de riscos para a inflação.

O Bank of America antecipou sua projeção para corte da taxa Selic de agosto para maio, com um corte de 25 pontos-base na Selic. Para os analistas do banco americano, o quadro de deterioração do mercado de crédito com alta alavancagem e aumento da inadimplência respaldam este cenário.

Em uma decisão que poderá dar o rumo para o mercado local, especialmente de ativos cíclicos como juros futuros e ações domésticas, Roberto Campos Neto e os demais diretores do BC viverão um par de dias marcados pelo embate entre riscos de baixa e de alta para a inflação.

Sem ajuda pelo lado fiscal, a política monetária deve seguir apertada, acelerando o passo da economia para a recessão. Isso deve gerar insatisfação de lideranças políticas que vêm criticando abertamente o nível da Selic. Uma queda de braço daquelas.

*O conteúdo da coluna é de responsabilidade do colunista e não reflete o posicionamento do FLJ.