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Gestor da SulAmérica Investimentos espera alta na Selic, mas vê ciclo mais curto que mercado

Reuters News Brasil
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Por: Marcio Aith, Luciano Costa e Luca Boni

São Paulo, 10/9/2024 – A decisão de juros do Comite de Política Monetária (Copom) mais aguardada do ano deve vir em sentido contrário à do Federal Reserve, elevando a Selic em 25 pontos-base, mas esse ciclo não deve ir tão longe como precificado hoje pelo mercado, disse Marcel Andrade, head de investment solutions na SulAmérica Investimentos, em entrevista à Mover.

“Pensamos em um ciclo de alta mais acomodado, para trazer a credibilidade do BC de volta. Porém acredito que é difícil levar a Selic a 12% com o mundo inteiro abaixando (juros)”, afirmou Andrade, que mudou recentemente de visão.

“Tínhamos ´call´ de manutenção. Brasil e Japão são os únicos mercados ´investíveis´ na contramão desse ciclo. Entendíamos que precisaria ter um evento muito idiossincrático de Brasil para isso. Mas os discursos do BC têm sido muito duros, no intuito de tentar trazer a credibilidade, ancorar as expectativas”.

Com esse cenário, Andrade prioriza alocação em ativos de renda fixa, que segundo ele estão muito atrativos nos últimos meses, principalmente títulos do Tesouro atrelados ao IPCA, as chamadas NTN-B, que ainda podem oferecer proteção contra eventual desancoragem da inflação.

“NTN-B pagando inflação mais uma taxa de 6% é um ativo muito atrativo e serve como ‘hedge’ para a carteira. Além de uma taxa real muito gorda, você ainda tem a inflação. Olhando no horizonte de médio prazo, temos recomendado a nossos clientes”, afirmou.

Em relação a alocação em bolsa, ele disse ter preferência no momento por alocações táticas, e não estruturais, geralmente via fundos de ações.

CENÁRIO EUA

Nos EUA, Andrade acredita que o Fed deve iniciar o ciclo de afrouxamento monetário em setembro de forma gradual, com um corte de 25 pontos-base, “visto que os últimos dados econômicos divulgados corroboram com uma desaceleração da economia e não com uma recessão”.

O head da SulAmérica acredita que a bolsa americana pode passar por algum processo de correção no curto prazo, principalmente no setor de tecnologia, que subiu muito nos últimos meses, com o mercado esperando um “grande trigger” para isso, que poderia ser justamente a esperada desaceleração.

“Mas somos positivos no médio e longo prazo com economia americana e renda variável. Pode ter algum tipo de reprecificação, mas vai voltar de forma forte ainda”, afirmou, acrescentando entender que a Inteligência Artificial ´veio para ficar´.

VISÕES PARA POLÍTICA

Além disso, as eleições americanas trazem incertezas para cenário global e podem gerar volatilidade no curto prazo, com o mercado tentando entender as propostas de cada candidato e como elas podem influenciar na economia dos EUA nos próximos anos.

“Estamos falando de um candidato incumbente que desistiu (Joe Biden), estamos falando de um outro candidato que já foi presidente e tomou o tiro (Trump). E estamos falando de uma candidata (Kamala Harris) que ninguém sabe exatamente qual vai ser a política econômica dela”.

No Brasil, onde haverá duas eleições importantes – as municipais e para a Presidência da Câmara dos Deputados -, Andrade recomenta muita atenção.

“Muita gente fala que a eleição municipal no Brasil não tem nenhum efeito, tem que ficar olhando mais as estaduais e presidenciais. A gente acha que, em grandes capitais, a eleição municipal é, sim, um grande ‘proxy’ para a eleição do Congresso daqui a dois anos. Então, ela é uma referência para poder ver o Congresso e ver o direcionamento que poderemos dar daqui a dois anos’’.

Na inusitada eleição para a capital paulista, onde um candidato bolsonarista fora do script (Pablo Marçal) está surpreendendo, nos métodos e nas intenções de voto, Andrade também vê sinalizações para o futuro do parlamento.

“Eu acho que de curto prazo, assim, a eleição em São Paulo está sendo um ponto meio fora da curva em relação às outras eleições municipais mais importantes, as grandes capitais. Mas, de novo, acho que, para investimentos de curto prazo, ela impacta muito pouco. Ela impacta mais lá na frente, se um candidato outsider ganhar alguma vantagem, a gente já começa a planejar um Congresso lá na frente um pouco diferente”.

Andrade também vê com atenção a possibilidade de o governo Lula perder muitas prefeituras e capitais importantes. “O governo atual tem dado muito peso a essas eleições municipais, até porque o seu partido perdeu muitas prefeituras, e ele sabe que ele precisa do Congresso para governar”.

Segundo ele, como hoje não tem força no parlamento, o governo federal está confiando em medidas judiciais para governar, levando tudo para o STF, para tentar ganhar na parte judicial. Se for uma eleição muito contra o governo, pode gerar outra preocupação, de como se governar.

“Então, tentando responder objetivamente a essa pergunta, para investimentos de curto prazo, acho que impacta pouco. Impacta mais em médio prazo a visão de país, de para qual lado que a gente vai caminhando”.

Com relação às eleições para a Presidência da Câmara dos Deputados, Andrade as considera fundamentais. “Acho que tem uma boa entrevista do Rodrigo Maia que falou que não sabia o quanto poder tinha aquela cadeira de presidente da Câmara. Mas, assim, acho que a relação do Lula com quem quer que seja eleito vai continuar difícil. Porque quem quer que seja eleito na Câmara vai tentar atender aos pleitos dos deputados que se acostumaram a abocanhar cada vez mais parte do Orçamento nos últimos dez anos”.

“Então, acho que o Lula vai continuar tendo uma relação difícil. Mesmo que ele consiga emplacar um grande nome aliado dele. O que o governo tem feito, o modus operandi desse governo, que tem até tido um relativo sucesso, é judicializar as coisas, como falei. Você perde na Câmara, e vai para o STF. E eu acho que, do jeito que está, independente do vitorioso a relação do governo e do Congresso vai continuar muito difícil.”

Para Andrade, a única maneira de resolver esse problema é se daqui a dois anos houver uma renovação importante, com maior alinhamento entre Congresso e o próximo presidente eleito.

OLHO NO FISCAL

O head da SulAmérica disse avaliar que o governo tentará passar no Congresso uma série de medidas que vão contra o fiscal nos próximos dois anos, mas alertou que não só o Executivo, mas o Congresso também quer gastar.

“Essa euforia com o Haddad, que tenta fazer um bom trabalho, esbarra no fato de que ele é um lobo solitário no governo”, afirmou.

“ Então, onde isso vai parar? Acho que, para parar, tem que ter uma sintonia muito grande entre o governo, o Congresso, o Senado, que a gente já experimentou, não é tão fácil assim”.

Andrade diz que este governo é o mais expansionista do mundo. “Estamos vendo uma série de aumentos reais para o funcionalismo público, mais gastos fiscais, mais assistencialismo. A gente viu agora a discussão do gás, do auxílio gás, isso tudo pode se transformar em inflação.”

SULAMÉRICA

Mais conhecida pela atuação em seguros e saúde, a SulAmérica, da Rede D´Or, consolidou uma área de investimentos independente que hoje administra não apenas reservas técnicas da seguradora, mas um total de R$75 bilhões.

A área de Investment Solutions da asset tem pouco mais de R$8 bilhões sob gestão direta, incluindo recursos de clientes institucionais, e opera desde renda fixa até investimentos internacionais e fundos.