por Marcio Aith
As invasões de terra voltaram ao campo brasileiro após a posse do Presidente Lula.
Plantações de eucalipto da companhia Suzano (SUZB3) ocupadas no Sul da Bahia; fazendas no Pontal de Paranapanema; propriedades privadas no Mato Grosso do Sul; e, para completar, a prisão por extorsão, pela polícia de São Paulo, de um dos maiores líderes Sem-Terra do País.
Todos esses fatos acima fizeram renascer o temor de um conflito no campo. Há poucos dias, o FLJ ouviu o ministro da Reforma Agrária, Paulo Teixeira. Ele disse que o papel do governo não é defender nenhum dos lados, mas estimular o diálogo e seguir fazendo a reforma agrária para solucionar esse fenômeno, que, segundo ele, é social e precisa ser visto com isenção e distanciamento.
Como contraponto, o FLJ ouviu o líder de uma das entidades mais moderadas e plurais do setor: Edivaldo Del Grande, presidente da Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp). Ele é também coordenador do Fórum Paulista do Agronegócio, que reúne 45 entidades do setor. Suas declarações foram as mais duras e diretas.
Leia, abaixo, a entrevista na íntegra:
“Diálogo? Com invasores? invasão pra mim é crime. Que diálogo o escambau!”
Marcio Aith: Presidente Del Grandes, as invasões de terra voltaram. Propriedades da companhia Suzano, no Sul da Bahia, foram invadidas. Assim como terras no Pontal de Paranapanema, onde a polícia paulista prendeu, por extorsão, o conhecido José Rainha, ex-líder do MST, agora à frente de outra organização. O FLJ ouviu há poucos dias o ministro da Reforma Agrária, Paulo Teixeira. Ele disse que o papel do governo é estimular o diálogo entre as partes. E seguir fazendo a reforma agrária para solucionar esse fenômeno, que, segundo ele, é social. O que o senhor achou?
Edivaldo Del Grande: Diálogo? Com invasores? invasão pra mim é crime. Que diálogo o escambau! Vou ser educado. Acho que o ministro deveria se preocupar muito com quem já está assentado e não está tendo assistência técnica. Até porque nós sabemos que grande parte dessas pessoas usadas por esses pilantras não tem qualquer intimidade com a agricultura, vive à margem das cidades . Em vez de dialogar com quem invade, o ministro deveria se preocupar em formular um programa de sustentabilidade econômica financeira para os assentados. Cada assentamento é uma realidade, cada terra tem a sua característica, cada local tem o seu índice de chuva pluviométrico. Então o que precisa? Realmente, é preciso ter gestão rural. Você não imagina o absurdo que já testemunhamos nesses assentamentos, sem nenhuma gestão. No Pontal do Paranapanema foram dados tratores e muitas máquinas para esses assentados. Pergunte se restou um? Sumiram todos depois de um ano.
Marcio Aith: Na sua opinião, o que move esses invasores, a maioria dos quais, é preciso admitir, humildes?
Del Grande: Meia dúzia de espertalhões provavelmente são os líderes aí dos movimentos sociais. Como é um movimento político, não existe vontade de se resolver o problema. Isso estou vendo principalmente após o PT assumir o governo. É uma ação política, partidária e não uma ação séria de assentamento, uma ação de melhoria de vida para o pequeno agricultor. Nós, no cooperativismo, fazemos isso. Nossas cooperativas tem muita agricultura familiar séria. Não existe um único espertalhão desses movimentos que se enriqueça e deixe nossos cooperados à míngua. Mas vamos aos invasores de terras? O que faz um assentado que sai com uma gleba de uma invasão? Vende aquela gleba dele e vai conduzido de novo para uma outra invasão. Isso pra mim é bandidagem.
Marcio Aith: As invasões de propriedade despencaram no governo Bolsonaro e voltaram agora. Qual é o gatilho que fez essas invasões voltarem?
Del Grande: Eu acho que houve um estímulo mesmo. E é uma pena. Até porque o Lula tem que entender que o país está dividido. E vai dividir ainda mais com essas invasões. Escute: invasão de propriedade privada tem que receber o mesmo encaminhamento das invasões de 8 de Janeiro. O que esse governo está estimulando com essa não atitude, principalmente o ministro Paulo Teixeira, vai na direção de um caos social. O Lula nos disse claramente que iria unir, apaziguar o país, e é isso que ele tem que fazer. Só que essas ações de invasão não unem ninguém, não apaziguam nada. Ao contrário: estimulam o conflito. Está tudo errado. Lula tinha que fazer o país crescer e gerar renda. E paz no campo significa produção e produtividade, significa emprego na cidade, porque 80% do recursos econômicos gerados no campo vão para a cidade, onde os insumos são produzidos, onde se produzem as máquinas, onde se produz exportação e riqueza que entram no país. Veja, tudo tem um limite. Não é uma autoridade do Executivo que vai determinar, conforme a sua conveniência, o que é crime e o que não é. Existem leis e Judiciário para isso.
Marcio Aith: Qual é o limite dos proprietários de terra?
Del Grande: Vivemos permanentemente num limite. Eu vou dar um exemplo para você, climático. Estou tentando colher. Mas só posso colher dentro de um período estabelecido pela seguradora. Não estou conseguindo, porque está chovendo demais. Não consigo colher e também não consigo plantar. Quer dizer, choveu maravilhosamente para produzir, vai produzir aparentemente bem, mas eu estou com um problema na colheita. Então, a agricultura é uma indústria a céu aberto. Você depende de clima para tudo. Às vezes seca, dá seca, e não produz nada. Então, nós já temos problemas demais dentro da estrutura, dentro do campo; nós já temos um problema portuário muito grande, seja para importar produtos e adubos, para a gente colocar na nossa produção, seja para exportar os grãos que a gente está exportando. E aí já temos que escutar alguns desavisados falando que tem que taxar a exportação. Isso é… perder mercado. Aí quando você vê essas invasões acontecendo em propriedades privadas, aí você fala ‘gente, do céu, não sei o que vai acontecer nesse país’. Aí quando você vê esses movimentos com bombas; a polícia não dá conta, os produtores se unem para fazer a defesa da propriedade deles. Isso nos conduz a um caminho: o do caos social.
Marcio Aith: Um conflito social.
Del Grande: Eu estava vendo um vídeo onde um líder dos sem-terra fala: “ah, os caras não estão querendo que a gente fique no campo, mas nós queremos a terra deles”. Como assim? “Nós queremos a terra deles?” Não, não, você vai comprar! Eu, quando quero um pedaço de terra, eu vou lá e guardo dinheiro, economizo e compro um pedacinho. Não é tomando.
Marcio Aith: O senhor é contra o Estado usar terras públicas, devolutas, para o Programa de Reforma Agrária?
Del Grande: Se o governo tem terra devoluta, ele que use suas terras para assentar, mas assentar com sabedoria, com assistência técnica, com estrutura de armazenagem, para que o assentado possa vender. Eu acho que esses programas de alimentação social são maravilhosos. Aqui em São Paulo funcionaram muito bem. Você me perguntou por que, na gestão anterior, não houve essas invasões de terras. E a resposta do Ministro Paulo Teixeira para você foi porque o ex-presidente armou o campo. Paulo Teixeira devia estar preocupado com as armas que vão para as favelas do Rio de Janeiro, que vão com o crime organizado, Essa é a preocupação. Isso pra mim é pano de fundo. As armas já existem. Então eles não têm que estar preocupados com isso, eles têm que estar preocupados em fazer um projeto social sério, uma ação social séria. Não é deixando invadir propriedade privada que ele vai conseguir.