Bolsonaro e sua defesa reagem; advogado de Cid recua na confissão

Depois de classificar a estratégia da defesa de Mauro Cid como "camicase", Bolsonaro pediu conversa entre advogados

Tania Rego/Agência Brasil
Tania Rego/Agência Brasil

Por Erick Matheus Nery — atualizado às 15h16

Uma simples declaração ameaçadora do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), somada a uma conversa entre advogados, fizeram com que o defensor de Mauro Cid, o criminalista Cezar Bitencourt, recuasse em suas declarações bombásticas feitas na quinta-feira passada à Veja e à GloboNews. Nelas, o advogado disse que seu cliente confessaria ter recebido ordem de Bolsonaro para vender as joias sauditas e, ainda, ter sido orientado a entregar ao ex-presidente o dinheiro vivo resultante das vendas.  

Depois das entrevistas de Bitencourt, Bolsonaro veio a público dizer que essa estratégia do advogado de Mauro Cid é “camicase”. Ato contínuo, ainda na noite de quinta, Bitencourt recebeu um telefonema do advogado de Bolsonaro, Paulo Bueno.

Na conversa, Bueno, segundo apurou o FLJ, disse a Bitencourt que a confissão de seu cliente, naqueles termos, levaria todos os personagens do drama à condenação criminal, pois Bolsonaro poderia revelar fatos envolvendo isoladamente Mauro Cid. E outros que poderiam comprometer profundamente o general Lorena Cid, pai de Mauro.

Ao que tudo indica, a declaração “camicase” e a conversa entre os advogados fizeram Bitencourt e seu cliente recuarem. Na sexta (18), Bitencourt desmentiu o que havia dito à Veja e a GloboNews. Confira o detalhamento a seguir:

LINHA TEMPORAL

No começo da noite de quinta, a revista Veja publicou uma reportagem na qual Bittencourt revelou que seu cliente pretende confessar à Justiça que realizou a venda de itens como relógios de luxos e joias e que Bolsonaro sabia que essas atitudes vão de encontro à legislação brasileira. Só as joias são avaliadas em R$ 1,1 milhão.

Em seguida, o advogado foi procurado pelos demais veículos de imprensa e, para as jornalistas Andreia Sadi e Camila Bomfim, da GloboNews, confirmou o que havia dito à Veja.

Com a matéria da Veja no ar, ainda na noite de quinta, Bolsonaro falou com a BandNews e classificou essa estratégia como “camicase”, tendo em vista que Cid está preso há mais de 100 dias e que ele faria de tudo para sair da prisão. Além disso, o ex-governante argumentou que não sabia da comercialização dos itens e que não recebeu nenhum dinheiro dessas operações.

Já na madrugada desta sexta, Bittencourt enviou a seguinte mensagem ao jornal O Estado de São Paulo: “Não, não tem nada a ver com joias! Isso foi erro da Veja, não se falou em joias”. Pela manhã, em conversa com o Estadão, Bolsonaro disse que pretende “clarear o mais rápido possível” o caso das joias e que Cid tinha “autonomia” no tema.

Na tarde desta sexta, em entrevista ao Estúdio i com Andreia Sadi, o advogado argumentou que não recuou no seu posicionamento, mas que teria ocorrido um equívoco de interpretação da imprensa pois ele citou o Rolex como uma joia.

“Fiquei inconformado foi com a publicação da Veja, dizendo que o Cid teria negociado o relógio e as joias. Isso não é verdade! Falei só do relógio, que é uma joia, evidentemente. Como não deu o que se pretendeu inicialmente, o chefe dele falou: ‘Resolve esse problema do Rolex’. Cid resolveu”, afirmou o advogado.

Na entrevista ao Estúdio i, o novo defensor de Cid também ressaltou que, em nenhum momento, seu cliente está “entregando Bolsonaro”: “Ele está apenas dizendo que quando recebeu o comando [de Bolsonaro:] ‘resolve esse problema do relógio’, ele foi resolver”. Contudo, a revista Veja publicou os áudios da entrevista, em que Bitencourt disse que o Cid “assume que foi pegar as joias”, no plural.

ENTENDA O CASO

Em termos práticos, esses itens de alto valor foram presenteados por autoridades estrangeiras ao casal Jair e Michelle Bolsonaro durante viagens em que representavam o País. Pela lei, esses itens, por seus valores, deveriam entrar no acervo nacional em vez de se tornarem bens pessoais do casal.

No entanto, tudo indica que o casal não apenas apropriou-se desses bens, como, com o auxílio de auxiliares diretos, os venderam nos Estados Unidos para obter lucros financeiros. Além disso, a Polícia Federal (PF) acredita que, ao perceberem que haviam sido descobertos, Bolsonaro e seu grupo tentaram recomprar os itens às pressas e devolvê-los ao patrimônio público brasileiro.

A confissão de Cid corrobora a tese da PF e reforçaria o argumento de que o ex-ajudante foi quem “sujou as mãos” em detrimento de lucros para Bolsonaro.

Após a revelação do conteúdo da revista, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal de Bolsonaro e Michelle. Além disso, o ministro do STF autorizou o pedido de cooperação internacional em que a PF solicita que as autoridades norte-americanas quebrem o sigilo bancário das contas norte-americanas dos investigados no caso das joias.