
FARIA LIMA JOURNAL
NO FIM DE SEMANA
O boletim Faria Lima Journal no Fim de Semana, do portal Faria Lima Journal e da agência de notícias Mover, traz uma seleção de conteúdos e leituras para investidores dispostos a gastar algum tempo no sábado e domingo para leituras mais aprofundadas de boas histórias e materiais informativos.
OS EUA constroem gasodutos; mas investidores têm sentimentos contraditórios, mostra Barron’s
A América do Norte vive o maior ciclo de expansão de gasodutos da história: empresas preveem investir US$53 bilhões só em 2025 em projetos de crescimento (recorde acima dos US$49 bi de 2019), segundo dados do Wells Fargo citados por Parag Sanghani, da Westwood Group, e compilados pela Barron’s nesta semana. O dinheiro está indo principalmente para (i) levar gás natural ao Golfo do México para alimentar os novos terminais de Gás natural liquefeito que exportam para Europa e Ásia, (ii) conectar usinas termelétricas aos data centers em expansão (ex.: Energy Transfer construindo dutos dedicados para três centros da Oracle no Texas) e (iii) rotas canadenses de exportação para a Ásia.
A política pró-fósseis do novo governo Trump acelerou aprovações de terminais de exportação de gás natural liquefeito e óleo, dando ainda mais gás ao movimento. A demanda projetada é robusta: a Kinder Morgan estima que a demanda americana de gás natural pode saltar mais de 25% até 2030 (28 bilhões de pés cúbicos/dia adicionais), puxada por exportações de gás natural liquefeito e pelo consumo voraz de energia dos data centers de IA. Analistas revisaram para cima as projeções de crescimento de lucros ajustados das empresas de midstream, de 4-6% para 6-8% ao ano nos próximos anos.
Empresas mais focadas em gás natural (ex.: Williams Cos. +10% no ano) vêm se saindo melhor do que as expostas a óleo e líquidos (Energy Transfer -15% no ano). No entanto, apesar do otimismo operacional, os investidores permanecem cautelosos – e com razão. O setor carrega cicatrizes profundas: no último grande boom, entre 2014-2015, gigantes como Kinder Morgan cortaram dividendos drasticamente quando os preços do petróleo despencaram e os produtores pararam de perfurar. Hoje o Tortoise North American Pipeline Fund sobe apenas 4% em 2025, contra 16% do S&P 500, refletindo o medo de repetição do roteiro “crescimento explosivo → colapso de commodities → cortes de distribuição”.
O consenso entre gestores ouvidos pelo WSJ é que o risco existe, mas é menor que em 2015: (a) os fluxos de caixa operacionais estão mais altos e dão maior margem de segurança para manter os dividendos; (b) grande parte da nova demanda (GNL e data centers) tem contratos take-or-pay de longo prazo, menos sensíveis a oscilações de preço spot; (c) os preços do petróleo podem continuar baixos em 2026, mas o gás natural americano segue extremamente competitivo globalmente.
O governador do Banco do Japão, Kazuo Ueda, emitiu nesta semana o sinal mais claro até o momento de que o conselho da autoridade monetária poderá elevar as taxas de juros em breve, com ênfase na reunião de 19 de dezembro dezembro, ao afirmar em discurso a líderes empresariais em Nagoya que o banco “considerará os prós e contras de elevar a taxa de política monetária e tomará decisões apropriadas”, avaliando economia, inflação e mercados globais.
As falas causaram um estresse na curva de juros soberana, e levou os rendimentos de curto prazo de títulos do Japão a alcançarem maior patamar desde 2008. Atualmente, os juros de curto prazo encontram-se no maior patamar desde 2008 no país asiático, em 0,5%. Assim, qualquer ajuste representaria uma moderação no estímulo, embora mantendo a taxa real em patamares muito baixos. Economistas do BNP Paribas interpretaram o discurso como “quase um aviso prévio” para dezembro, enquanto Barclays e JPMorgan anteciparam suas previsões de alta para este mês, antes fixadas em janeiro. Os mercados reagiram prontamente: traders passaram a ver 76% de chance de elevação em dezembro – ante 58% na sexta-feira anterior –, com probabilidade subindo para 94% até janeiro.
A inflação persistente e a fraqueza do iene – que impulsiona custos de importação e pressiona preços – reforçam o argumento por ação imediata, e a maioria dos observadores espera que a primeira-ministra do país asiático, Sanae Takaichi, acate a alta. Ao destacar especificamente a reunião de dezembro e a decisão sobre juros, em vez de mera política geral, Ueda ecoa o padrão de janeiro, quando sinalizou e elevou as taxas no mês seguinte; ele enfatizou que tal movimento seria “aliviar o acelerador” para um crescimento sustentável e estabilidade de preços, sem “frear a atividade econômica”.
Esse passo pode sinalizar o fim de anos de estímulo agressivo no Japão, com impactos potenciais em fluxos globais de capital, e merece atenção na reunião do BoJ marcada para dezembro. Por décadas, investidores globais tomavam empréstimo barato em iene (em razão de juros negativos entre 2016 e 2024) para financiar investimentos em ativos de maior rendimento, como Treasuries ou ações em mercados emergentes. Esse ‘carry trade’ injetou trilhões de dólares em liquidez global. No entanto, com juros de curto prazo subindo no Japão, esse custo de financiamento em iene aumenta, o que pode levar a uma “desmontagem” de posições até então feitas.
Uma alta de juros no Japão também pode desencadear repatriação de recursos, com instituições asiáticas – as maiores detentoras estrangeiras de Treasuries – tendo maior incentivo para trazer capital de volta para o país asiático.
Jovens em busca de riqueza em novos mercados de apostas, destrincha a Bloomberg
O boom dos mercados de previsão está criando uma nova onda de startups que querem surfar no sucesso de Polymarket e Kalshi – plataformas que permitem apostar em eleições, esportes, clima e praticamente qualquer evento, reportou a Bloomberg nesta semana. A brasileira Luana Lopes Lara, por exemplo, tornou-se a mais jovem mulher a se tornar bilionária, após rodada de capital na Kalshi avaliar companhia em US$11 bilhões e levantar US$1,0 bilhão para companhia.
Com a volta de Trump à presidência dos Estados Unidos e a remoção de barreiras regulatórias às apostas (inclusive com a Truth Social prestes a entrar no jogo), o setor explodiu. Polymarket e Kalshi, juntas avaliadas em cerca de US$ 19 bilhões, agora incentivam esse ecossistema com programas de financiamentos: Polymarket já separou mais de US$1 milhão e Kalshi lançou um fundo de US$2 milhões este mês para atrair desenvolvedores e manter a fidelidade das melhores ideias à sua plataforma.
Dezenas de startups surgiram nos últimos 12 meses, muitas fundadas por gente extremamente jovem – tem fundador de 19 anos (Gondor), 22 anos (Kairos) e até adolescentes. Elas oferecem desde fundos que copiam os melhores traders (Polyfund), plataformas de empréstimo usando posições em mercados de previsões, como colateral (Gondor, que levantou US$2,5 milhões com valuation de US$25 milhões), ferramentas de dados e detecção de possíveis insider trading (Polysights), até robôs de trading institucional e hedging automatizado que comparam preços entre Kalshi e Polymarket em tempo real (Kairos).
Os defensores, como o ex-chefe da CFTC Chris Giancarlo (hoje no advisory board da Polymarket), veem nisso um movimento “mais jovem e democrático” que pode criar o próximo ecossistema financeiro de bilhões. Por outro lado, advogados e reguladores alertam para os riscos: produtos que permitem alavancagem, empréstimos contra posições e trading automatizado estão surgindo num vácuo regulatório quase total, o que pode ser um pesadelo para investidores sem experiência.
É hora de soar o alarme sobre riscos fiscais e financeiros crescentes, alerta o Financial Times
O Banco de Pagamentos Internacionais (BIS) está voltando a soar o alarme, como fez antes da crise de 2008, lembrou o Financial Times em coluna nesta semana. Desta vez, o foco é a combinação de duas coisas preocupantes: as dívidas públicas dos países ricos estão nos níveis mais altos desde a Segunda Guerra Mundial e provavelmente vão continuar subindo, por causa de envelhecimento da população, mais gastos com defesa, resistência a cortar déficits e possíveis novos choques econômicos.
O segundo problema é que o sistema financeiro mudou muito desde 2008. Os bancos, que antes eram os grandes compradores de títulos públicos, perderam espaço. Quem cresceu enormemente foram os intermediários financeiros não bancários (NBFIs): fundos de pensão, seguradoras, fundos de investimento, hedge funds e fundos de mercado monetário. Hoje esses NBFIs são muito maiores que os bancos no total de ativos financeiros globais.
Porém, dentro dos NBFIs há perfis bem diferentes: fundos de pensão e seguradoras: compram títulos públicos de longo prazo para combinar com suas obrigações futuras (ex.: pagar aposentadorias). Hedge funds e alguns fundos de mercado monetário: operam com muita alavancagem (dinheiro emprestado), muitas vezes sem margem de segurança (chamada “haircut zero”) e usam derivativos de câmbio em grande escala.
Essas mudanças trazem riscos novos para o mercado de títulos públicos, que ainda é considerado o ativo mais seguro do mundo. Se houver um choque (juros subindo rápido, pânico ou resgates em massa), esses investidores podem ser forçados a vender tudo ao mesmo tempo, criando quedas bruscas de preço e uma crise que pode se espalhar rapidamente. O BIS defende regras mais uniformes para bancos e não bancos, mais transparência, uso obrigatório de câmara de compensação e limites reais à alavancagem, para evitar que uma nova crise transforme até a dívida dos governos em fonte de instabilidade global.



