FLJ acompanhou Voga Conference, em Brasilia

Gestores veem governo Lula readequando discurso sobre fiscal após deterioração nos mercados

Gestores veem governo Lula readequando discurso sobre fiscal após deterioração nos mercados

Brasília, 19/8/2024 – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) parece ter readequado sua tese predominante outrora sobre gastos fiscais, minimizando riscos de descumprimento de metas, avaliaram gestores de fundos locais, que atribuem a mudança aos desdobramentos negativos do posicionamento anterior da gestão sobre a dinâmica dos ativos brasileiros, com deterioração significativa sobre o câmbio e expectativas de inflação.

Na visão do CEO da Armor Capital, Alfredo Menezes, enquanto há um “núcleo duro” do Partido dos Trabalhadores pressionando por mais gastos fiscais, há uma outra ala, capitaneada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que tem atuado como “meio-termo”, e esse time estaria ganhando a disputa neste momento.

O CEO da Reach Capital, Ricardo Campos, também vê uma mudança de comportamento recente em Brasília. Para ele, o governo federal tentou por muito tempo um “braço de ferro” com o mercado que não trouxe bons resultados.

“Lula viu que não estava dando muito certo (disputa com mercado). Ele viu que o dólar explodiu, que é o principal termômetro da economia, e parou. Deram uma boa diminuída em discursos como ‘gasto é vida'”, afimou.

Os gestores falaram durante participação na Voga Conference 2024, em Brasília, na sexta-feira, acompanhada pela Mover e Faria Lima Journal.

Nos últimos dias, diversas gestoras e bancos têm passado a projetar chances de elevação da Selic pelo Banco Central nas últimas reuniões. Em meio a esse cenário, o presidente Lula disse em entrevista na sexta-feira que “quando tem que aumentar juro, tem que aumentar”.

O mercado viu a fala de Lula alinhada ao discurso recente do diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, visto como franco favorito a ser indicado pelo presidente para liderar a autarquia a partir de 2025. Ele afirmou na semana passada que uma possível elevação de juros “está sobre a mesa” do Copom.

POLÍTICA MONETÁRIA
Para Menezes, da Armor, o câmbio será a palavra-chave para a trajetória da política monetária local, com a variação do dólar como principal variável para ditar o rumo da Selic. Ele projeta manutenção da taxa básica de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em 10,5% neste ano, em um cenário no qual o dólar gire em torno do câmbio de equilíbrio, estimado em torno de R$5,40.

Nos Estados Unidos, Menezes avalia que o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) deverá lançar mão de dois cortes de 25 pontos-base da taxa-alvo Fed Funds neste ano, nas reuniões de setembro e novembro. Também em sua visão, o discurso a ser adotado pelo chair do Federal Reserve, Jerome Powell, no simpósio econômico de Jackson Hole, nesta sexta-feira, deverá endossar leitura de alívio monetário já a partir do próximo mês.

Menezes alertou, entretanto, que um eventual alívio de maior magnitude da taxa-alvo Fed Funds, de 50 pontos-base, poderia denotar um sinal de recessão da economia norte-americana, penalizando, em última instância, os mercados locais. Ele antevê risco de um aperto monetário pelo Copom nesse cenário hipotético.

Campos, da Reach Capital, reconheceu que um pouso abrupto da economia norte-americana é um risco, embora menos provável, na visão da asset. Ele também aposta que o ciclo de afrouxamento monetário promovido pelo FOMC terá efeito positivo para os ativos de risco.

A nível local, Campos entende que a bolsa segue atrativa, com preços extremamente baratos, apresentando o Brasil como um dos candidatos a investimento com “menores mútiplos” do mundo. Em sua visão, a bolsa tem espaço para andar caso o Copom retome o ciclo de queda dos juros.

´SETE MAGNÍFICAS´
Apesar de parte do mercado começar a ver riscos de uma bolha em negócios de tecnologia e inteligência artificial, Campos, da Reach, mostrou-se entusiasta com as teses das chamadas “Sete Magníficas”, ou Magnificent Seven, nos EUA– grupo de companhias composto por Alphabet, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla.

“Apesar delas terem subido (ações), o resultado delas subiu brutalmente. Elas, como um todo, negociam 10% mais barato do que historicamente sempre negociaram”, pontuou, citando diferenciais claros e barreira de entrada na indústria. Ele também pontuou que essas companhias são menos afetadas por discussões sobre eventual recessão norte-americana.

Na Armor, por outro lado, Menezes detalhou que a gestora tem portfólio alocado no sistema financeiro, especificamente em bancos de varejo locais e globais, diante de expectativa de realocação da tese de Inteligência de Artificial para outros setores.

“No meu viés, deve haver um pouco de realocação das Magnificent Seven para a economia real. Empresas usuárias de IA vão se beneficiar. E aí entram seguradoras e bancos.”

ELEIÇÕES EUA
A plataforma de ambos os candidatos à presidência dos Estados Unidos possui viés um pouco mais inflacionário, mas um eventual Congresso dividido entre republicanos e democratas poderia limitar o risco associado, avaliou o gestor do BTG Total, Daniel Vairo, também presente no evento em Brasília.

No caso de uma eventual vitória de Donald Trump, pelo lado dos republicanos, há expectativa da volta de política de tarifas sobre importações, que pode impactar preços.

“Não consigo ver o mesmo grau de volatilidade, impacto, que vimos na primeira eleição dele. Outro lado da plataforma republicana é pró-mercado, como reduzir impostos sobre empresas. Mas não há mais o mesmo espaço que havia no primeiro mandato dele, não só pelo nível, como por fiscal.”, disse Vairo.

Já a plataforma de Kamala Harris, candidata dos democratas, prega tributação de empresas e mais ricos, visando redistribuição de renda e mais programas assistencialistas. “Tem característica bastante inflacionária. Mas, de novo, creio que a magnitude disso depende de como o Congresso estará dividido”, avaliou o gestor do BTG Total.

Vairo classifica as eleições norte-americanas como um “evento muito falado”, mas ainda não vê tanta volatilidade nos mercados. “Acho que estaremos vivendo mais as questões do ciclo econômico. Estamos em um novo momento do ciclo, a política monetária sendo relevante.”