Empresas recorrem a FIDCs em busca de liquidez, mas pagam mais caro

Mercado sofre ainda os efeitos da crise da Americanas

Pixabay
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Por Lucinda Pinto

O encolhimento recente do mercado de dívida privada ampliou a procura de empresas por soluções de crédito estruturado, especialmente os Fundos de Investimento em Direito Creditório (FIDCs), como alternativa para obtenção de liquidez. Porém, mesmo neste segmento existe maior seletividade, o que se traduz em custos altos e prazos mais curtos.

Segundo o diretor de Debt Capital Markets da RGS Partners, Victor Barreira, o FIDC costuma ser uma opção que funciona quando há algum distúrbio no mercado, embora seja mais caro.” Isso porque, na estrutura de securitização, o investidor não corre o risco da companhia, mas, sim, do seu cliente final, o que acaba minimizando o efeito da piora das condições gerais de crédito na operação.

Neste momento em que o mercado sofre ainda os efeitos da crise deflagrada pela recuperação judicial da Americanas, o FIDC entrou no radar das empresas. “Quando a gente está em um cenário de mercado mais tranquilo, em que o crédito bancário está disponível e existem outras fontes de financiamento, muitas empresas não aproveitam a janela para estruturar outras opções. Quando a torneira de crédito fecha, então todo mundo pensa em fazer um FIDC”, disse Barreira. “Agora, a conversa sobre o FIDC aumentou, embora o custo hoje esteja bem mais alto.”

Segundo o diretor de riscos da Empírica, Gustavo Belger, a média das carteiras de FIDC do mercado deve crescer de 15% a 20% neste ano. Já a média de crescimento da carteira de crédito dos bancos deve aumentar de 7% a 8%. “Mas esses números significam um encolhimento em termos reais, considerando que parte dessa expansão vem da taxa de juros paga nas operações”, explicou.

O FIDC é uma modalidade de crédito estruturado, por meio da qual a empresa antecipa recebíveis – de qualquer receita recorrente como cartão de crédito, vendas a prazo ou tarifas – mediante uma taxa de desconto. Esses recursos são levantados junto a investidores e destinados diretamente ao fundo, sem passar pelo caixa da empresa. Com isso, o investidor não está exposto à companhia, e sim à sua base de clientes, pulverizando o risco.

Neste instrumento, existem ao menos duas categorias de cotas: as sêniores, com rentabilidade prefixada, e as subordinadas, com retornos de risco mais altos, que só receberão quando todos os cotistas seniores já tiverem sido pagos. A própria companhia emissora do FIDC fica com parte das cotas subordinadas. Se houver algum desenquadramento, como, por exemplo, o aumento da inadimplência que comprometa o desempenho do fundo, as cotas subordinadas funcionam como uma espécie de amortecimento – elas sentirão o impacto e impedirão que o investidor sênior seja afetado.

A proporção entre as duas classes tem sempre que ser mantida. Então, se houver um desenquadramento, os cotistas sêniores devem fazer um aporte ou receber uma parte de seus recursos de volta. Com esses mecanismos de proteção, a estrutura fica bastante segura para o investidor, ampliando espaço para que empresas de diferentes tamanhos e ratings acessem este instrumento.

Com o cenário econômico mais frágil, os juros altos e a inadimplência crescendo entre pessoas físicas e jurídicas, os administradores e gestores dos FIDCs redobraram a cautela. Segundo Belger, isso se reflete no aumento do custo –a taxa média exigida pelos investidores subiu de 2,8% ao mês, no ano passado, para 3,4% ao mês atualmente.

Os fundos também estão aceitando operações em que o cliente final da companhia tenha um “score” de crédito em torno de 620 pontos (segundo a escala da Serasa), contra 500 pontos no ano passado. O prazo encolheu para uma faixa entre 36 meses a 48 meses, ante 60 meses anteriormente.

Diante deste cenário, pequenas e médias empresas enfrentam dificuldades maiores, especialmente as que atuam em setores mais diretamente atingidos pela taxa de juros, como o de Varejo.

“A indústria está muito pessimista e isso acaba contaminando todo o mercado”, afirmou o presidente da Iosan, Richard Ionescu, gestora que atende empresas com faturamento de até R$30 milhões anuais, com foco no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. “O que é difícil para as empresas em São Paulo tem um efeito muito mais intenso nessas outras regiões do país”, afirmou.

Além do aumento do spread, Ionescu relatou à Mover que os investidores estão resistentes a entrarem em operações ligadas ao setor de Varejo. “Ninguém quer nem ouvir falar de Varejo, não importa o tamanho”, disse. “Meu sentimento é que até a virada de semestre, o negócio pode melhorar um pouco, mas neste momento a situação do pequeno lojista é muito complicada”, concluiu.