Brasília, 19/6/2024 – O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu nesta quarta-feira manter a taxa básica de juros, a Selic, em 10,50% ao ano, em decisão unânime, e pontuou que a política monetária deverá se manter contracionista “por tempo suficiente”, em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação, como também de ancoragem das expectativas em torno de suas metas.
A decisão, com todos nove votos do Copom, mostrou união de diretores indicados pelo presidente Lula para a autarquia e de nomes do governo anterior, incluindo o chefe do colegiado, Roberto Campos Neto, alvo de recentes ataques de Lula e de seu partido, o PT. Para alguns analistas, a unanimidade na decisão desta noite pode reduzir as chances de o atual diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, ser apontado novo presidente do BC, leitura consolidada entre parte dos agentes do mercado anteriormente.
“Lula deve indicar um presidente para o BC que não agrade tanto o mercado, visto que ele precisa de uma taxa de juros mais baixa, mesmo que a inflação fique mais alta”, disse o chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, em participação na TC News.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, escreveu no “X” que “não há justificativa técnica, econômica e muito menos moral para manter a taxa básica de juros em 10,5%”. Para ela, “não será fazendo o jogo do mercado e dos especuladores que a direção do BC vai conquistar credibilidade”.
Ontem, em entrevista à CBN, Lula disse querer indicar alguém “maduro” para o BC, com experiência, e que não se submeta a pressões do mercado, o que alguns viram como sinalização contrária a Galípolo– visão esta reforçada agora pelo seu voto a favor da manutenção da Selic.
Para o economista-chefe do BMG, Flavio Serrano, a unanimidade foi o ponto principal da decisão, e a leitura do comunicado sugere que o Copom estaria pausando, e não encerrando de vez o ciclo de alívios, que poderia continuar após o início de cortes pelo Federal Reserve, nos Estados Unidos. Consenso do mercado aponta para início dos cortes nos EUA entre o terceiro e quatro trimestre deste ano.
MENSAGENS DO COMITÊ
O Copom justificou a decisão de manutenção diante de uma necessidade de maior cautela, dado cenário global “incerto”, resiliência na atividade local, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas.
“O Comitê se manterá vigilante e relembra, como usual, que eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”, pontuou o colegiado no comunicado da decisão desta noite.
Também de acordo com o Copom, a conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.
Com a manutenção da Selic, foi a primeira interrupção do ciclo de alívio monetário do Copom desde agosto de 2023. Do lado fiscal, o colegiado pontuou monitorar com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. Reafirmou que política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para ancoragem das expectativas.
O colegiado também não alterou seu balanço de riscos no comunicado desta noite, pontuando que permanecem fatores de risco em ambas as direções. Mencionou maior persistência das pressões inflacionárias globais e maior resiliência na inflação de serviços como riscos altistas. Do lado dos riscos baixistas, apontou desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, e eventual impacto de aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrar mais forte que esperado.
NOVAS PROJEÇÕES
Em suas projeções de inflação no cenário de referência, o Copom elevou a estimativa para a inflação ao fim de 2024 a 4,0%, ante 3,8% estimados em maio. Para 2025, as estimativas avançaram a 3,4%, ante 3,3%. O Copom também introduziu um cenário alternativo, no qual a Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante, que contempla o ano de 2025. Nele, o IPCA encerra o ano de 2024 em 4,0%. Em 2025, iria a 3,1%.
A projeção para a inflação de preços administrados em 2024 foi revisada a 4,4%, ante 4,8%. Já para 2025, manteve-se em 4,0%.
Também de acordo com o Copom, o conjunto de indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo maior do que o esperado. A inflação cheia ao consumidor tem apresentado trajetória de desinflação, enquanto medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta em divulgações recentes.
No exterior, o Copom citou que o ambiente se mantém “adverso”, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. O Copom avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de emergentes.
(GP | Edição: Luciano Costa | Comentários: equipemover@tc.com.br)