Petrobras (PETR4) não é "investível" por critérios "ESG", diz fundador da FAMA Investimentos

Ao Scoop by Mover, especialista detalha análise

Agência Brasil
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Por Juliana Machado e Luciano Costa

Apesar de ter sinalizado investimentos em transição energética e energias renováveis, a Petrobras (PETR4) não deu nenhum passo na redução da exploração de combustíveis fósseis – ao contrário, ainda briga pelo direito de extrair petróleo na Bacia da Foz do Amazonas. Para o fundador e gestor da FAMA Investimentos, Fabio Alperowitch, do ponto de vista ambiental, social e de governança corporativa (ESG, na sigla em inglês), a companhia não é um ativo “investível”.

“A Petrobras, para mim, não é ‘investível’. Vejo sinais contraditórios na empresa, que fala sobre a importância da energia limpa, mas insiste em explorar a Foz do Amazonas”, disse Alperowitch em entrevista exclusiva à Mover. “Ainda que haja investimento em renováveis, é preciso que isso venha com a transição energética.”

Também causou ruído entre especialistas em ESG – Alperowitch entre eles – a decisão da Petrobras de extinguir a diretoria de Relacionamento Institucional e Sustentabilidade. A área foi substituída por uma diretoria de Transição Energética e Sustentabilidade, com a companhia prometendo entrar em novos negócios como hidrogênio verde e geração eólica offshore.

Outras petroleiras globais têm direcionado recursos a negócios de energia limpa e transição, e algumas até mudaram de nome para mostrar essa nova fase, como a Total se tornando TotalEnergies, e a antiga estatal norueguesa Statoil dando lugar à Equinor. As britânicas Shell e BP foram além, e chegaram a divulgar metas prevendo graduais movimentos de redução na produção de óleo e gás, mas ambas recuaram dos objetivos iniciais neste ano, apresentando planos menos agressivos.

Embora ativistas na Inglaterra venham pressionando ambas as gigantes do petróleo para se moverem em relação à mudança climática, os novos e menos ambiciosos planos em transição energética resultaram em altas nas ações dessas companhias, mostrando como os negócios em renováveis ainda são um tema espinhoso nas relações entre empresas de óleo e gás e acionistas.

Além da sustentabilidade, riscos ligados à governança também estão no radar de investidores da Petrobras, com frequentes temores de intervenção estatal na companhia, destacou Alperowitch. Na semana passada, por exemplo, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), disse que a estatal poderia ajudar o governo a controlar o preço dos combustíveis, atuando “no limite de sua governança”. Não ficou imediatamente claro o que ele quis dizer com a frase.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

ENERGIA LIMPA E PETRÓLEO

A Petrobras, para mim, não é ‘investível’. Não vejo nenhum assunto sério da Petrobras com o tema ESG ou expectativa de avanço dessa agenda na nova direção da empresa. Vejo sinais contraditórios sobre a importância da energia limpa, mas insistindo em explorar a Foz do Amazonas. Isso é surreal. Não adianta o aumento de energias renováveis ser percentual, isso precisa ser acompanhado de menos poços de petróleo e não tem nenhum passo firme nessa direção. Ainda que haja investimento em renováveis, é preciso que isso venha com transição energética e não tem isso nem no discurso. Precisamos entender que não há maneira alguma de ter respeito pela agenda climática com exploração de combustíveis fósseis.

FOZ DO AMAZONAS

Além da questão de explorar a Foz do Amazonas em si, tem um fator até mais delicado, que é a implicação socioambiental. É uma área com altíssima incidência de biodiversidade. O fenômeno da pororoca não é só nos rios, por exemplo, tem ventos que são potentes na região e qualquer impacto ambiental pode ser catastrófico. A região é uma área de proteção ambiental e tem depósitos de corais extremamente relevantes. Além disso, tem efeitos potenciais para populações ribeirinhas. Essa exploração da Petrobras seria a primeira a ser feita, mas abre portas para novas licitações na região. O risco implícito de abrir essa oportunidade de as petroleiras explorarem a região é extremamente delicado.

Sobre a questão de ser uma exploração a 500 quilômetros da costa, não é exatamente assim que funciona, temos a ideia de que isso é distante, mas não é. Há barreiras de corais próximas a 50 quilômetros. Além disso, já vimos momentos em que houve vazamentos a 8 mil quilômetros [da costa] e o óleo chegou à praia. O [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] Ibama foi bem taxativo e trouxe uma visão contundente, mas até mesmo o presidente [Luiz Inácio Lula da Silva] tem essa inclinação pela exploração, como já declarou, assim como foi no passado, nas fotos imortalizadas dele com as mãos sujas de óleo.

GOVERNANÇA

Existem elementos de governança que devemos levar em consideração quando falamos de estatais. No caso da Petrobras, houve interferência em política de preços, desmontagem de conselho, entre outras ingerências. Considero isso uma questão crítica de governança. Uma empresa estar sujeita a uma troca de comando integral a cada quatro anos é um problema de governança ao qual as estatais estão expostas, independentemente das particularidades de cada uma. A companhia tem uma cultura, um comando e um planejamento, e tudo pode mudar em quatro anos. Do ponto de vista de investidor de longo prazo, que é nosso caso, ficar vulnerável a isso é um problema e ele é intrínseco às estatais. Não investimos em Petrobras por vários motivos, e esse também é um deles. Mas, mais do que isso, nenhuma estatal passa no nosso crivo.

Esta reportagem foi publicada primeiro no Scoop, às 10H55, exclusivamente aos assinantes do TC. Para receber conteúdos como esse em primeira mão, assine um dos planos do TC.