Lula busca moldar narrativa oficial

O perigo do oficialismo na reescrita da história - coluna de Marcio Aith

O perigo do oficialismo na reescrita da história - coluna de Marcio Aith
Agência Brasil

O recente episódio envolvendo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reinauguração da galeria de ex-presidentes no Palácio do Planalto, ilustra um momento delicado na relação entre política e memória histórica.

Acompanhado por auxiliares, Lula expressou insatisfação com a falta de contextualização histórica nas exposições da galeria. Durante o evento, ele deu uma bronca em um assessor e destacou a necessidade de explicitar, por exemplo, que Dilma Rousseff sofreu um impeachment que ele considera um “golpe”, que Michel Temer assumiu sem ter sido eleito diretamente e que Jair Bolsonaro foi eleito, segundo ele, “com base em mentiras”. O presidente ainda sugeriu incluir informações sobre outros líderes históricos, como Getúlio Vargas, pedindo que se registre seu suicídio e os contextos de seus mandatos.

Esse episódio revela uma preocupação sinistra de Lula com a forma como ele e seus adversários políticos serão retratados pela história. E reflete um esforço para moldar a narrativa oficial conforme suas perspectivas. Ao exigir que a galeria destaque as “mentiras” de Bolsonaro, o presidente busca influenciar diretamente a memória coletiva. Se formos rever a história com o rigor que Lula parece desejar, seria difícil encontrar um presidente que não tenha recorrido a promessas exageradas ou mesmo inverdades durante campanhas eleitorais.

A política, por sua natureza, envolve narrativas que buscam persuadir. Nesse sentido, a tentativa de criar uma versão oficial pode ser perigosa. Curiosamente, Lula deveria estar satisfeito, pois a galeria de presidentes não menciona que ele foi preso por corrupção, ainda que suas condenações tenham sido anuladas por questões técnicas. Esse fato reforça o cuidado necessário ao tratar a história como algo imparcial e plural.

A história é mais do que um registro de eventos; é uma interpretação de fatos com base em evidências e contextos. Quando líderes políticos tentam impor uma visão unilateral, comprometem o caráter essencial desse processo. Classificar o impeachment de Dilma Rousseff como um “golpe” ou as eleições de Bolsonaro como fruto de “mentiras” são interpretações políticas válidas e legítimas em determinados segmentos, mas não podem ser tratadas como verdades absolutas. A imposição dessas perspectivas ignora a multiplicidade de vozes e visões.

A manipulação da memória coletiva para atender interesses presentes compromete a credibilidade das instituições e reduz a história a um instrumento de controle ideológico.

A história pertence à sociedade como um todo e deve ser tratada com responsabilidade, pluralidade e respeito à complexidade dos fatos, e não como um reflexo distorcido das conveniências do presidente de plantão.