Aneel e governo discutem impacto de ´gatos´

´Mapa´ da milícia e do tráfico entra em debate sobre tarifa de energia da Light

´Mapa´ da milícia e do tráfico entra em debate sobre tarifa de energia da Light

São Paulo, 20/06/2024 – Pesquisas que detalham o domínio de territórios do Rio de Janeiro por milícias e grupos de traficantes podem começar a entrar em breve no radar de alguns investidores do mercado financeiro, devido aos impactos milionários sobre os resultados de empresas como a elétrica Light, listada na bolsa de valores, que serão inclusive tema de um evento internacional no próximo mês.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) promove em 4 de julho um seminário para discutir consequências de ligações ilegais de energia sobre concessões do setor, como a da Light, que recorreu a processo de recuperação judicial no ano passado para garantir a solvência das operações, em meio às crescentes perdas devido aos chamados “gatos” elétricos.

Ao entrar com pedido de recuperação judicial, que paralisou dívidas de R$11 bilhões, a Light alegou motivos incluindo “perdas não-técnicas, eufemismo para furtos de energia”, que segundo ela geraram prejuízo de R$680 milhões em 2021, e R$550 milhões em 2022.

Atualmente, a Light tem perdas não-técnicas, causadas principalmente pelos furtos, que correspondem a 65% da carga de baixa tensão. O número cresce trimestre a trimestre desde ao menos 2023, quando era 58%, e o governo federal inclusive discute agora uma legislação especial para tratar o assunto.

‘FOGO CRUZADO’

No evento da Aneel, com participação de executivos da Light e representantes da agência, os desafios de distribuidoras de energia “em áreas de elevada complexidade socioeconômica” serão discutidos com pesquisadora do Instituto Fogo Cruzado, que desenvolveu metodologia própria para monitorar tiroteios em centros urbanos brasileiros e produz indicadores sobre violência armada.

Pesquisas do Fogo Cruzado de 2019 já mostravam controle de milícias em 25% dos bairros do Rio, enquanto o Comando Vermelho ocuparia 24% das regiões; facções como Terceiro Comando e Amigos dos Amigos também possuem áreas, embora menores.

A Aneel também ouvirá uma coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança da Fundação Getúlio Vargas e representantes de empresas que sofrem com perdas comerciais em seus serviços em outros países, como a indiana Tata Power, a Enel da Colômbia e a distribuidora argentina Edenor.

GOVERNO AVALIA REGRAS

No momento, o governo federal discute, no Ministério de Minas e Energia, regras para renovação de contratos de concessão de distribuidoras que expiram nos próximos anos, incluindo da Light, que vence em 2026.

Uma minuta de decreto do governo aponta que a Aneel poderá definir tarifas “diferenciadas” em regiões “de elevada complexidade ao combate às perdas não técnicas ou de elevada inadimplência”, com possibilidade de metas de desempenho diferenciadas também nessas áreas, em mudanças que segundo especialistas podem favorecer a Light.

À Justiça, a Light disse que tem havido “aumento de restrição de acessos a áreas que se encontram dentro da sua concessão, principalmente em áreas dominadas por grupos criminosos paramilitares”, apesar de “vultosos investimentos” em tecnologias e medidas de proteção do sistema.

As ações da Light avançam 34,5% desde o pedido de recuperação judicial, em 12 de maio de 2023, e sobem quase 4% neste mês, após plano aprovado com credores ter sido homologado pela Justiça, com a empresa projetando iniciar agora um período de reestruturação que incluirá capitalização por investidores.

Os maiores acionistas da Light hoje são a gestora WNT, ligada ao investidor Nelson Tanure, com 35% das ações, e o fundo Samambaia, do megainvestidor Ronaldo Cezar Coelho.

(LC | Edição: Luca Boni | Comentários: equipemover@tc.com.br)