Por Marcio Aith e Bruno Andrade
Rodrigo Pacheco (46), o jovem presidente do Senado brasileiro, desdobra-se em 100 assuntos enquanto aguarda o embarque para Brasília na ala de autoridades do Aeroporto de Congonhas. Conversa com deputados, e, depois, bate um papo, rindo, com o ministro Gilmar Mendes. Ao sentar-se para a entrevista ao Faria Lima Journal (FLJ), discorreu desde a necessidade de regulamentação da IA (Inteligência Artificial) à necessidade de manter a privatização da Eletrobras (ELET3). Mas o assunto que mais o preocupa é a fragilidade da base parlamentar do governo e as consequências dela decorrentes.
“Portanto, é preciso se dar tempo, mas evidentemente o tempo passa e é preciso que o governo cuide melhor da sua articulação política”, afirmou o Senador sentado em uma poltrona de um sala privativa do pavilhão de autoridades do aeroporto de Congonhas.
Veja a entrevista na íntegra:
FLJ: O senhor vê algum risco nessa empreitada do governo de tentar reestatizar a Eletrobras?
Rodrigo Pacheco: A verdade é que a capitalização da Eletrobras foi algo muito refletido na legislatura passada. O Congresso Nacional se debruçou sobre esse tema, tanto a Câmara quanto o Senado, muitos dos deputados que participaram, muitos dos senadores que participaram ainda estão no Parlamento nesta nova legislatura. Esse foi um projeto muito amadurecido que se tornou uma realidade. E o objetivo era de fato tornar a Eletrobras mais competitiva numa área que o Brasil precisa evoluir, que é a energia. Então, eu considero que essa é uma realização feita. Por isso, eu considero que seria muito importante que nós cuidássemos das pautas do Brasil e da evolução do nosso país a partir de uma realidade já concretizada. E a capitalização da Eletrobras é uma realidade concretizada, a União continua como acionista, mas ela a partir do momento que tem a iniciativa privada participando de sua composição de sua gestão, se torna muito mais competitiva. Isso é bom para o Brasil. Então, eu acredito que haverá por parte de todos a compreensão de que essa é uma realidade de aposta que assim deve continuar.
FLJ: O governo enfrentou alguns transtornos na Câmara na votação de alguns dos projetos que serão discutidos agora no Senado. Você acredita que o governo tem alguma fissura na sua base de apoio? Ou o problema é de resistência na Câmara?
Rodrigo Pacheco: Eu considero que é preciso dar tempo ao governo. É verdade que já se passaram quatro meses, mas ainda há um tempo aí neste primeiro semestre para que articulação política seja alinhada, para que os ministros de estado possam definir suas prioridades nas suas pastas a partir do diagnóstico dos problemas do Brasil.
Nós enfrentamos um início de ano muito turbulento em função dos atentados contra a democracia e isso ocupou muito a agenda nacional. Houve uma forte ocupação de energia de todas as instituições e de todos os poderes. E a política de um modo geral se envolveu nisso.
Portanto, é preciso se dar tempo, mas evidentemente o tempo passa e é preciso que o governo cuide melhor da sua articulação política. Essas questões da Câmara, o governo terá lá derrotas e vitórias, assim como no Senado, isso é normal da democracia. O que o Congresso Nacional tem que ter, tanto Câmara quanto Senado, é compromisso com o Brasil.
Ou seja, aquilo que for bom para o país nós avançamos, Câmara e Senado; aquilo que for ruim para o país, ainda que a proposta venha do governo, nós temos que ter a liberdade, autonomia e independência de dizer não. Isso é um exercício pronto de democracia. Mas de fato, o governo precisa cuidar bem da sua articulação para ter mais vitórias do que derrotas no parlamento.
FLJ: Na semana passada, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), culpou o ministro Alexandre Padilha por não conseguir articular os projetos do governo na Casa. A relação do Padilha com o Senado é igual a do Padilha com a Câmara? O ministro tem uma boa relação com o Senado?
Rodrigo Pacheco: É preciso dar tempo ao ministro Alexandre Padilha para que ele possa definir a articulação política, ouvir de todos os ministros quais são as suas posições e prioridades, conhecer todos os parlamentares. Então a minha posição é de dar tempo ao Ministro Alexandre Padilha. Em algum momento nós podemos chegar à conclusão que a articulação está deficiente e que precisa de melhora, mas por enquanto não vamos chegar a essa conclusão. Eu prefiro dar tempo e um voto de confiança ao Ministro Alexandre Padilha.
FLJ: Como você avalia o novo marco fiscal, que só prevê aumento de receitas e não traz aumento de despesas?
Rodrigo Pacheco: Seria muito importante tratar esse tema da despesa não simplesmente como corte de despejo. Se eu indagar você o que deve ser cortado, nós vamos ter dificuldade de chegar no consenso, porque podemos cortar em políticas públicas, programas sociais, despesas com pessoal, etc. Então, o corte de despesa é sempre um exercício difícil de ser feito assim de pronto, mas nós podíamos cuidar da despesa em relação à qualidade das coisas.
Ou seja, não é necessariamente cortar despesas, mas fazer um trabalho qualitativo de gestão para que a despesa brasileira seja direcionada especialmente para as camadas mais carentes.
Esse é um trabalho que o governo precisa cuidar através de suas pastas específicas. A gestão dos Ministérios do Planejamento e Fazenda devem ter realmente um planejamento para uma qualidade do gasto público, ainda que a despesa permaneça. Como está.
E nós temos um grande desafio. O Brasil tem que aumentar as suas riquezas através de aumento de arrecadação. Mas não com um aumento de novos impostos, porque o contribuinte não aceita pagar mais tributo.
FLJ: Mas como?
Com o aumento da base de cálculo, ou seja, aqueles que não pagam tributos passam a pagar. Queremos combater a sonegação fiscal, combater injustiças tributárias e criar programas que sejam sustentáveis como a repatriação de recursos internacionais, o pagamento e o parcelamento de multas para agências reguladoras e a liquidação de dívida ativa através de programa de transação tributária.
Tudo isso é injeção de recursos no orçamento Federal e prevê um aumento de receita, como é a taxação dos jogos de apostas esportivas, que é um tema também já aprovado na Câmara e que nós vamos cuidar no Senado. É uma série de projetos, que significa uma melhor e uma maior arrecadação do Estado brasileiro, sem que haja sacrifício à sociedade brasileira.
FLJ: Uma das propostas é o Carf, que piora de uma certa maneira piora a situação dos contribuintes brasileiros. O senhor vê alguma perspectiva de voltar atrás nesse projeto?
Rodrigo Pacheco: O Carf é uma instância administrativa de segundo grau de discussão de temas tributários. A partir do momento que há uma atuação uma definição no primeiro grau há esse recurso do Carf, muitos temas são ali tratados. Há uma discussão em relação ao resultado das votações do Carf. A proposta inclusive é restabelecer o voto de qualidade, que foi extinto um tempo atrás.
Então, essa é uma discussão que precisa ser feita. O que o Carf precisa fazer é julgar com isenção, com fundamentos técnicos, com imparcialidade as pessoas tributárias. Eu acho muito razoável também que, uma vez superada essa fase do Carf, você pode, tanto a Fazenda quanto o contribuinte, recorrer à Justiça.
Mas nós temos que estimular mecanismos, essa é uma boa oportunidade, quando você discute essa questão do voto de qualidade no Carf, que é estimular mecanismos de composição e transação.
Ou seja, havendo um empate, por exemplo, inaugurar uma fase de discussão sem multas e juros, para permitir que o contribuinte possa pagar ou parcelar. Deve-se dar a oportunidade dele utilizar prejuízo fiscal, utilizar precatórios, para evitar judicialização. Esse tema é realmente muito encrencado e difícil.
FLJ: Sobre outras questões econômicas. Metas de Inflação. O Senhor acha que há espaço para estabelecer a meta contínua e retirar o ano-calendário?
Rodrigo Pacheco: Essa é uma questão que está sendo debatida no arcabouço fiscal. É muito importante que a gente não se antecipe tanto, até para permitir que os deputados possam ter uma melhor reflexão disso, é algo muito técnico.
É uma posição que o Ministério da Fazenda também tem que externar. Acho que isso é um tema que, necessariamente, nós temos que ouvir o poder Executivo e o Ministério da Fazenda. Isso porque tudo que não pode acontecer é o Congresso permitir ou estabelecer esse tipo de mudança em contrariedade ao plano do Ministério da Fazenda, que é quem vincula as suas ações a esses planos. Então vamos aguardar a discussão do acabamento social e ouvir, sobretudo, o Poder Executivo, porque esse é um tema que precisa ter a participação do executivo.
FLJ: Senador, a CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro já é realidade no Congresso. Qual será o foco da CPMI? O ex-presidente, Jair Bolsonaro, será investigado?
Rodrigo Pacheco: O foco da CPMI deve ser a apuração do fato determinado de todos aqueles que tenham contribuído direta ou indiretamente, material ou intelectualmente É a partir desta apuração que se definirá quem serão os personagens que devem ser investigados. Não se pode estabelecer ou se prejulgar com um foco específico em uma CPMI, ela é mais em relação ao fato do que pessoas. Pessoas são consequências da apuração do fato.
FLJ: Mas e o ex-presidente Jair Bolsonaro, ele chegaria a ser convocado para a CPMI ou não?
Rodrigo Pacheco: Isso é uma trabalho que a CPI vai precisar fazer para responder.
FLJ: O senhor não considera que o Judiciário está sendo muito rígido com os detentos dos atos do dia 8 de janeiro?
Rodrigo Pacheco: A gente deve considerar que o que aconteceu no dia 8 de Janeiro de Janeiro foi algo gravíssimo, foi o ponto alto de uma tentativa de golpe de Estado, de tomar de assalto à democracia brasileira. E havia outros tantos fatos, que agora estão sendo revelados, como o planejamento de um golpe de estado no Brasil.
Então é gravíssimo. As pessoas responsáveis pelo 8 de janeiro devem ser punidas. O grau de punição cabe ao poder judiciário, não me cabe, como presidente do Senado, fazer qualquer tipo de juízo de valor sobre o processo de natureza criminal no âmbito da Justiça. E só quem conhece é aquele que está trabalhando no processo. As questões sobre as provas, se o caso é de prisão preventiva ou de prisão temporária, se o caso é de tornozeleira eletrônica ou de alguma outra medida cautelar, isso cabe à Justiça. E eu confio na justiça do Brasil.
FLJ: Há um projeto de lei que busca regulamentar a inteligência artificial no Brasil. Qual é o receito que o senhor tem, de que este projeto estaria censurando uma nova tecnologia?
Rodrigo Pacheco: Esse projeto é fruto de uma comissão de juristas, que foi instituída no ano passado. E essa comissão de juristas cuidou de definir um projeto de lei compilando diversas ideias relativamente ao tema Inteligência Artificial. Ele foi liderado por um ministro do STJ, o Ministro Ricardo Villas Boas Cueva.
Outros tantos juristas participaram e ao final eles me entregaram um anteprojeto de lei. No final das contas, eu transformei esse anteprojeto de lei num projeto de lei pela presidência do Senado para que pudesse tramitar na casa.
O objetivo é disciplinar a questão da Inteligência Artificial, sobretudo os métodos dos critérios, para que haja transparência na condução da inteligência artificial no Brasil.
O que significa dizer que a inteligência artificial é muito bem-vinda, ela é uma inovação tecnológica. Mas ela tem que ter métodos para identificamos se algum tipo de direcionamento, algum tipo de discriminação, algum tipo de captura de mentes de pessoas em razão é desse desse Instituto.
Portanto, é uma disciplina legislativa para poder impor responsabilidades àqueles que usam essa ferramenta da inteligência artificial no dia-a-dia. De modo geral, eu acho isso muito importante, pois ele é um projeto que disciplina e regularmente as redes sociais.
Esse projeto de inteligência artificial é completamente diferente do PL das Fake News, que está tramitando no Congresso Nacional, e eu considero ambos muito importantes quando nós temos essa disciplina.
E que as redes sociais a inteligência artificial sejam utilizadas para o bem, pois quando se utiliza para o mal, para disseminar o ódio, para disseminar intolerância, para tentar contra instituições, para tentar contra pessoas e reputações, obviamente tem que ter uma disciplina legal.