Por Erick Matheus Nery, atualizado às 19h43
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve a taxa Selic em 13,75% pela sétima vez seguida. A decisão apresentada nesta quarta (21) ignora, pela quarta vez, os atos de braveza do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que reclama publicamente da ausência de queda das taxas de juros.
“A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia”, destacou o comunicado.
A manutenção da taxa Selic em 13,75% já era esperada pelos agentes econômicos, conforme apresentado pelo levantamento do TC Consenso dessa semana. O Boletim Focus desta semana, que reúne as expectativas do mercado para os indicadores macroeconômicos, mostrou que os especialistas projetam que a Selic deve terminar o ano na casa dos 12,25%.
Na reunião de agosto de 2022, o Copom aumentou a Selic para o atual patamar e, desde então, ela segue nos 13,75% que desagradam políticos e setores do mercado, como o varejo. Além do presidente, uma das principais críticas aos juros na casa dos dois dígitos é a empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza (MGLU3).
No início do mês, ela participou de um evento junto com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Na ocasião, ela disse que já havia ligado 20 vezes para o economista pedindo a redução da Selic e que, se fosse por ela, “ligaria mais 20 ou 30 vezes”.
Confira o posicionamento do Copom na íntegra:
O ambiente externo se mantém adverso, ainda que com revisões positivas para o crescimento do ano. Apesar da atenuação do estresse envolvendo bancos nos EUA e na Europa, a situação segue demandando monitoramento. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas, inclusive com a retomada de ciclos de elevação de juros em algumas economias, em um ambiente em que a inflação se mostra resiliente.
Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores mais recentes de atividade econômica segue consistente com um cenário de desaceleração da economia nos próximos trimestres. O crescimento acima do esperado no primeiro trimestre refletiu principalmente o forte desempenho do setor agropecuário. Não obstante o arrefecimento recente dos índices de inflação cheia ao consumidor, antecipa-se uma elevação da inflação acumulada em doze meses ao longo do segundo semestre. Ademais, diversas medidas de inflação subjacente seguem acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação. As expectativas de inflação para 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus recuaram e encontram-se em torno de 5,1% e 4,0%, respectivamente.
As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência situam-se em 5,0% em 2023 e 3,4% em 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 9,0% em 2023 e 4,6% em 2024.
O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se
(i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais;
(ii) alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal a ser aprovado pelo Congresso Nacional e, de forma mais relevante para a condução da política monetária, seus impactos sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação, e sobre os ativos de risco; e
(iii) uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos.
Entre os riscos de baixa, ressaltam-se
(i) uma queda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local, ainda que parte importante desse movimento já tenha sido verificado;
(ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, em particular em função de condições adversas no sistema financeiro global; e
(iii) uma desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária.
Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75% a.a. e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia. O Copom conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas e avalia que a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado tem se mostrado adequada para assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê avalia que a conjuntura demanda paciência e serenidade na condução da política monetária e relembra que os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza e Renato Dias de Brito Gomes.
Análises do Copom
Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, afirmou que o tom do comunicado veio mais hawkish [duro] que o esperado, “mas suave, se comparado aos comunicados das reuniões anteriores”.
“Chama a atenção no comunicado o fato do Copom ainda não sinalizar que teremos corte de juros na próxima reunião, o que vai contra o que o mercado esperava e revela o tom hawkish do comunicado. Todavia, na minha visão, o cenário atual está melhor que o esperado e isso deve se materializar em corte em algum momento no ano de 2023”, comentou Alves.
Débora Nogueira, economista-chefe da Tenax Capital, também acredita que o comunicado foi mais duro do que o esperado, mas acredita que o tom do texto “foi no sentido de abrir espaço para flexibilização nas próximas reuniões”.
“A comunicação é compatível com flexibilização em agosto, mas o BC optou por assegurar graus de liberdade e não se comprometeu com queda de juros iminente. Para o corte em agosto, teremos de ter a confirmação da meta de inflação em 3,0% na reunião do CMN e a continuidade de bons resultados na inflação corrente e na pesquisa semanal do Focus. Esperamos que as condições permitam, ao fim, um corte de 0,25% em agosto”, ressaltou.
Daniel Cunha, estrategista-chefe da BGC Liquidez, reforçou três mudanças no comunicado: retirar o trecho sobre a volta da subida dos juros, substituir “vigilante” por “cautela e parcimônia” e ajustar o tempo verbal associado a “a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado” de maneira a não se referir mais ao futuro. “Apesar da barra alta, abriu a porta para o ciclo de cortes com -25bps (cautela e parcimônia), onde os dados irão apontar se será na reunião de agosto ou setembro”, complementou.