BC eleva projeção de crescimento do PIB em 2023 de 1% para 1,2% em Relatório de Inflação

O documento cita que o Copom irá perseverar até que se consolide a desinflação e a ancoragem das expectativas

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Por: Patricia Lara, Felipe Corleta e Fabrício Julião

O Banco Central (BC) elevou marginalmente a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023 para 1,2% no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) referente ao primeiro trimestre do ano, ante estimativa de 1% no documento anterior, divulgado em dezembro.

“A revisão moderada reflete, especialmente, surpresas positivas em alguns componentes do setor de serviços no quarto trimestre de 2022 − deixando carregamento estatístico do setor para 2023 ligeiramente maior do que o anteriormente esperado”, diz o documento.

Mesmo com a revisão em alta, a projeção continua refletindo um cenário prospectivo de desaceleração da atividade econômica em 2023, em comparação ao observado nos dois anos anteriores.

O documento cita que o Comitê de Política Monetária (Copom) irá perseverar até que se consolide a desinflação e a ancoragem das expectativas.

O BC elevou as projeções para a inflação deste ano e dos dois próximos no RTI. No cenário em que usou a Selic prevista na pesquisa Focus e o câmbio calculado pela paridade do poder de compra, a projeção para 2023 foi elevada de 5,0%, no relatório anterior, para 5,8%.O patamar se situa acima do limite superior do intervalo de tolerância (4,75%) da meta para a inflação (3,25%).

A probabilidade de a inflação superar os limites do intervalo de tolerância, no cenário de referência, em 2023 passou de cerca de 57% no RTI anterior para 83% neste relatório.

Para 2024, a projeção passou de 3% para 3,6%, enquanto a projeção para 2025 subiu de 2,8% para 3,2%, ambos acima do centro da meta para os respectivos anos, que é de 3%, conforme fixado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

Em relação aos trimestres ao longo deste ano de 2023, o BC revisou em baixa a estimativa de inflação acumulada, de 5% para 4,8% no primeiro trimestre e de 3,9% para 3,8% no segundo trimestre. Já as projeções para os dois últimos trimestres foram revisadas em alta. A do terceiro trimestre passou de 5,9% para 6% e a do quarto, de 5,0% para 5,8%.

CRÉDITO

A autarquia revisou a projeção de crescimento do crédito livre para as empresas em 2023 de 8,0% para 6,0%, já “considerando o ambiente de maior aversão ao risco no curto prazo em decorrência de eventos específicos relacionados a empresas de grande porte”.

Para 2023, a projeção de crescimento do saldo de crédito no Sistema Financeiro Nacional (SFN) foi reduzida de 8,3% para 7,6%. O recuo da projeção foi determinado pelo crédito livre, refletindo a surpresa negativa com os dados divulgados no último trimestre de 2022 e a elevação da trajetória esperada para a taxa básica de juros (Selic), diz o box.

No crédito livre para pessoas físicas, o avanço da inadimplência e os níveis elevados de endividamento e comprometimento de renda também contribuíram para a revisão da projeção pelo BC, de 9,0% para 8,0%.

CRÉDITO DIRECIONADO

No crédito direcionado, o BC elevou a projeção de crédito direcionado para o segmento de pessoas jurídicas, de 6,0% para 7,0%, em linha com a expectativa de postura ligeiramente mais expansionista de alguns atores presentes nesse mercado do que o esperado anteriormente. Para pessoas físicas, a projeção de crescimento do crédito direcionado foi mantida em 9%.

O crédito direcionado é um empréstimo subsidiado que possui características atrativas do ponto de vista do tomador, com taxas de juros inferiores e prazos maiores em relação às práticas do mercado.

COMPATÍVEL COM O CICLO

Para o BC, as novas projeções do crescimento nominal do estoque de crédito para 2023 são ligeiramente inferiores às apresentadas no relatório anterior.

“Continuam indicando um processo de desaceleração no ritmo de crescimento do crédito compatível com o ciclo de aperto monetário”, diz o box do Relatório Trimestral de Inflação.

ARCABOUÇO FISCAL

O BC cita que o novo arcabouço fiscal deve impactar as expectativas de inflação e o prêmio de risco em seu RTI, divulgado nesta quinta-feira.

O documento diz que as expectativas de retomada de déficits primários em 2023 e de trajetória crescente do endividamento público para os próximos anos indicam que o quadro fiscal ainda requer atenção.

Para 2023, o Banco Central cita que as medidas anunciadas pelo Ministério da Fazenda podem reduzir o déficit em R$242 bilhões.

No curto prazo, o BC cita que a aprovação da Emenda Constitucional 126 trouxe gastos maiores que o esperado. A emenda foi aprovada no fim de 2022. O documento do BC lembra que a referida emenda estabeleceu o prazo de 31 de agosto deste ano para o Executivo encaminhar projeto de lei complementar instituindo um novo regime fiscal.

Mas o Ministério da Fazenda deve anunciar hoje o novo regime. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), deve apresentar a nova proposta fiscal, às 10h30.

A apresentação do documento ocorrerá antes da coletiva do Banco Central para comentar o Relatório Trimestral, às 11h00, quando o diretor de Política Econômica, Diogo Abry Guillen, comenta o texto. Na sequência, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, participa de coletiva de imprensa sobre política monetária.

“Todavia, permanece incerteza relevante em relação à trajetória da política fiscal nos próximos anos”, diz o documento do BC.

CAUTELA DO BC

O cenário traçado hoje no Relatório Trimestral de Inflação justifica uma postura mais rígida na condução da política monetária, afirma o estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil, Luciano Rostagno. Ele chama a atenção para o trecho do documento que diz a autoridade monetária vê 83% de chance da meta ser descumprida.

“A inflação ainda está forte. A alta probabilidade de descumprimento da meta reforça a necessidade de cautela do BC em relação ao corte dos juros”, disse. “Ainda assim, acredito que vamos ter espaço para corte da Selic este ano, pois ainda há muita incerteza sobre a crise dos bancos lá fora e sobre a desaceleração do mercado de crédito, além da expectativa gerada em torno do novo arcabouço fiscal”, acrescentou.

Segundo estimativa de Rostagno, haveria espaço para redução na Selic a partir de setembro deste ano. Ele projeta que a taxa básica de juros deve encerrar 2023 em 12,50% e chegar a 10% no fim de 2024.

Rostagno disse também que ainda não há sinais de contaminação do sistema de crédito, mas sinais de estresse pontuais que estão sendo observados pelo Banco Central. A revisão do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,0% para 1,2% reforça que a atividade econômica está resiliente, segundo o especialista.