Haddad aposta em novo arcabouço fiscal para normalizar relação com BC

Ministro foi o crítico mais brando da decisão do Copom

Agência Brasil
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Por Beatriz Lauerti, Márcio Aith e Stéfanie Rigamonti

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em referência ao arcabouço fiscal que seria apresentado ao Banco Central, defendeu que o governo “vai fazer chegar à autarquia a análise do que é mais recomendável para a economia brasileira encontrar o equilíbrio, de trajetória da dívida, da inflação, das contas públicas, do atendimento às demandas sociais”. Haddad disse que “ o mercado muda de um dia para o outro”, e afirmou que quando o novo arcabouço fiscal for apresentado, em abril, segundo ele, “as projeções podem mudar”.

Para o político, o atraso na divulgação da proposta não deve ser considerado pelo Comitê de Política Econômica do Banco Central (Copom). Fato é que, em sua última ata, o Banco Central elogiou a iniciativa do governo em formular um novo arcabouço fiscal. O BC esperava recebê-lo antes da reunião do comitê, o que não ocorreu.

Haddad classificou como “preocupante” o comunicado do Copom, divulgado ontem, após o grupo de trabalho decidir manter a taxa básica de juros (Selic) no patamar atual de 13,75%, e deposita esperanças na ata a ser apresentada pela autarquia.

O tom do comunicado foi duro, considerando o temor do exterior sobre o agravamento da crise bancária e destacando que a inflação no Brasil continua acima da meta, apesar da desaceleração da atividade econômica nacional.

Ainda, o documento pontuou que ainda há muitas incertezas em relação ao arcabouço fiscal e o peso dele na trajetória da dívida pública brasileira. E, para piorar o humor de Haddad, o comunicado diz explicitamente que existe a possibilidade de novos ciclos de altas dos juros.

Haddad esperava por um tom diferente, diante das projeções sobre as contas públicas, que estão se confirmando, segundo ele. “O comunicado deixa em aberto o ciclo (de alta) de juros, num momento em que a economia está retraindo e que o crédito está com problema. O Copom chega a sinalizar até a possibilidade de uma subida da Selic, que já é hoje a mais alta do mundo”, disse, em entrevista a jornalistas em Brasília.

O ministro criticou a postura do comitê, dizendo que as empresas podem ser comprometidas, assim como o resultado fiscal,  “a depender das decisões futuras”.

O chefe da Fazenda deposita suas esperanças na ata do Copom, que será divulgada em 28 de março, esperando maior amenidade do Banco Central, como ocorreu na última reunião do comitê.

A reunião do Copom de fevereiro resultou em um comunicado rígido após a decisão de juros, mas em seguida, a ata trouxe certo alívio a Haddad.

Ataques ao presidente do BC

Na última terça-feira, em entrevista ao site Brasil 247, Lula afirmou que “vai continuar batendo e tentando brigar” para que a taxa de juros seja reduzida. Assim, a decisão do Copom claramente não agradou ao chefe do Executivo.

Além disso, na mesma entrevista, Lula lamentou não poder demitir o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sem citá-lo nominalmente. “Eu não posso demitir porque isso depende muito do Senado”, disse.

Por outro lado, Campos Neto vem sofrendo pressão para cumprir a meta de inflação, definida em 3,25% para este ano pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

Nesta quinta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que os integrantes do Copom “pagarão o preço pelo que estão fazendo”, em referência ao patamar elevado da taxa Selic.

A declaração aconteceu durante visita do presidente ao Complexo de Itaguaí, no Rio de Janeiro, após questionamentos de jornalistas em relação à decisão de manutenção da taxa básica de juros em 13,75% ontem. Lula então disse que não iria comentar cada relatório que saísse do Copom e afirmou que continuará trabalhando para a economia brasileira crescer além do que está previsto.

Sobre o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, Lula disse que quem tem que cuidar do destino dele é o Senado, mas afirmou que a autoridade monetária não está cumprindo com a sua função.

“Ele só tem que cumprir a lei que estabeleceu a autonomia do Banco Central. Ele precisa cuidar da política monetária, mas precisa cuidar também do emprego, da inflação e da renda do povo, é isso que está na lei”, afirmou. “Todo mundo sabe que ele não está fazendo isso. Se ele estivesse fazendo, eu não estaria reclamando”, continuou.

Segundo apuração do blog da jornalista Andréia Sadi, do jornal g1, do Grupo Globo, o governo pretende pressionar os senadores para endereçar a destituição de Campos Neto, o que só pode ser viabilizado caso o desempenho do economista seja insatisfatório para o cumprimento dos objetivos do BC.

O Executivo tem uma estratégia baseada em manter polêmicas ao redor de Campos Neto e, caso aconteça uma crise econômica, a ideia é buscar responsabilizar o presidente do BC para blindar Lula, de acordo com o blog.

O plano serviria para juntar votos suficientes para o Senado aprovar a demissão de Campos Neto, caso o BC não mude a postura.

A Casa Legislativa Federal precisa aprovar a decisão com um número determinado de votos, conforme previsto na lei de autonomia do Banco Central. Hoje, não há apoiadores o suficiente, segundo apuração do blog.