Por Stéfanie Rigamonti
A instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para investigar os atos de 8 de janeiro aumentará o custo para administrar a base do governo no Congresso e diminuirá ainda mais seu poder de barganha diante de um Centrão cada vez mais forte. Isso em um momento em que o governo tem pressa para aprovar o arcabouço fiscal e medidas saneadoras que farão com que o orçamento do próximo ano se sustente dentro das metas de zerar o déficit fiscal.
“O governo tentou ao máximo evitar a CPI porque isso dá visibilidade para a oposição e aumenta o custo de se administrar a base no Congresso, utilizando recursos na comissão que poderiam ser usados para aprovar medidas no Plenário”, disse à Mover o diretor no Brasil da consultoria de risco político Eurasia Group, Silvio Cascione.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vencia a disputa ao não instalar uma CPI sobre o 8 de janeiro, mas depois da repercussão de imagens vazadas em que o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, Marco Gonçalves Dias, aparece no Palácio do Planalto enquanto manifestantes depredavam o prédio, sem conter os invasores, o jogo virou e ele se viu forçado a negociar postos governistas na comissão. Dias acabou pedindo demissão do cargo após o vídeo vazar.
Segundo Cascione, a agenda econômica prioritária do governo não deve ser afetada pela CPI do ponto de vista da celeridade e do sucesso da aprovação, já que ele tem ouvido inclusive de parlamentares da oposição que tanto o arcabouço fiscal quanto a Reforma Tributária são de interesse do Congresso como um todo, para que seja possível criar um orçamento plausível para o próximo ano. “Arcabouço fiscal é consenso no Congresso, que precisa aprovar uma âncora que substitua o Teto de Gastos”, afirmou.
Apesar de pautas de interesse amplo ainda terem apoio para andar rápido, CPI deve dificultar a manutenção dos textos aos moldes dos interesses do governo, e parlamentares que capitaneiam as discussões já planejam alterações no novo arcabouço fiscal para endurecer certas regras da proposta enviada pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento.
Um deputado graduado do PT disse à Mover que a oposição já está se movimentando para fazer obstrução total, com o objetivo de impedir o prosseguimento da análise do marco fiscal e, assim, ganhar tempo nas negociações.
Esse deputado disse que parlamentares aliados ao governo trabalham, por exemplo, para aumentar a lista de despesas que devem ficar de fora das regras de limite de gastos para além do que é constitucional, como os financiamentos para estatais financeiras, caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Enquanto isso, a oposição está trabalhando para colocar mais travas aos investimentos com recursos públicos”, afirmou essa fonte.
Em meio a esse cabo de guerra, o governo agora tem um trabalho extra de controlar a CPI do 8 de janeiro, que exigirá esforço máximo para conseguir presidir a comissão, disse à Mover o cientista e consultor político e assessor parlamentar, Paulo Kramer.
“O governo está na defensiva, tentando controlar os trabalhos da comissão, mas não é certo que essa CPI vai terminar em pizza”, analisou Kramer. Segundo o especialista, os últimos dois blocões formados por partidos mais ao centro no Congresso, ao contrário de fortalecer o governo, deixam Lula cada vez mais na mão do Parlamento, em um cenário em que o presidencialismo de coalização a que o petista estava acostumado foi implodido ao longo dos últimos sete anos.
“Os blocões vão cobrar mais do governo. Eles aumentaram o seu poder de barganha”, disse Kramer. Para ele, é impossível prever o resultado da CPI, já que o clima que ainda permanece desde o fim das eleições é de racha, de polarização e de radicalização entre governo e oposição.