Por: Luciano Costa
Após 20 anos de forte crescimento da indústria global de energia eólica, investidores se acostumaram a ver o setor como uma ilha de prosperidade, mesmo diante de crises financeiras ou desacelerações econômicas. Mas isso parece estar mudando, com um cenário agora de ventos turbulentos, ao menos no curto prazo.
Gigantes como a americana GE e a alemã Siemens enfrentam prejuízos e dificuldades operacionais em suas divisões de equipamentos eólicos, enquanto grandes empresas de geração de energia, como a sueca Vattenfall e a dinamarquesa Orsted, desistiram recentemente de projetos na Europa e nos Estados Unidos, alegando disparada de custos.
Fora as pesadas perdas financeiras em balanços e no valor das ações das empresas, as dificuldades dessas gigantes ameaçam gerar efeitos em cascata, como alguns já vistos até aqui: GE e Siemens paralisaram suas fábricas de equipamentos eólicos no Brasil, apertando o mercado.
Geradoras renováveis que utilizaram turbinas dessas empresas em seus projetos agora se preocupam com a manutenção dos equipamentos, e também com eventuais falhas operacionais – a Siemens Energy precisou fazer provisão de cerca de US$2 bilhões para lidar com reparos e multas associadas à sua mais recente família de máquinas eólicas, e equipamentos da GE também apresentaram casos de falhas pelo mundo, inclusive no Brasil.
Apesar desses transtornos já parecerem em parte leite derramado, o horizonte de curto prazo não é o mais promissor. O ritmo de implementação de novos parques eólicos tradicionais no mundo caiu em 2022 em relação ao ano anterior pela primeira vez em duas décadas, e especialistas projetam que o mercado brasileiro vai desacelerar de forma importante no ano que vem.
O presidente da fabricante de pás eólicas Aeris, Alexandre Negrão, disse que segue muito otimista com as perspectivas de médio e longo prazo do setor, mas projetou que o Brasil deve implantar 2 gigawatts a menos em projetos em 2024, na comparação com recorde de 5 gigawatts esperados neste ano. Ele disse ainda que a empresa está na expectativa por uma aceleração maior no mercado americano, segundo maior do mundo, atrás só da China.
Mas o que está acontecendo?
Em todo o planeta, fabricantes do setor eólico e empresários de energia renovável foram surpreendidos pela disparada de custos depois da pandemia de Covid-19, que desorganizou cadeias globais de suprimentos e levou a saltos de até 40% nos valores de equipamentos.
Essa turbulência ainda veio em momento em que alguns fabricantes enfrentavam desafios operacionais decorrentes de uma recente corrida pelo lançamento de novos e mais potentes equipamentos. Embora tenha resultado em uma nova geração de turbinas eólicas de dimensões impressionantes – instaladas em torres de até 150 metros de altura, contra 80 metros em famílias anteriores de máquinas –, esse salto tecnológico também trouxe maiores índices de problemas operacionais, segundo fontes do setor.
Em paralelo, o segmento de energia eólica “offshore” – cujas torres são instaladas em oceaons –, que vinha acelerando, começou a mostrar soluços devido à disparada de custos, já naturalmente mais altos, o que trava projetos nos EUA e Reino Unido. Após um leilão para novos parques fracassar em setembro, os britânicos precisaram anunciar neste 16 de novembro um aumento de quase 70% nos subsídios para eólicas no mar, visando cumprir metas de expansão da fonte.
No Brasil, que nos últimos anos foi o terceiro maior mercado global para o setor, as fortes chuvas dos últimos anos encheram os reservatórios das hidrelétricas e derrubaram os preços no mercado de energia a níveis que reduzem o apetite de investidores por novos projetos eólicos no momento, o que deverá frear o segmento em 2024, e talvez nos próximos anos.
Como se não bastasse, as renováveis eólicas também enfrentam discussões mais complexas sobre seus impactos ambientais. Diversas notícias recentes na imprensa sobre demandas sociais relacionadas a usinas eólicas chamaram a atenção no setor, e o governo chegou a criar uma “mesa de diálogo” ligada à Presidência da República para discutir “direitos e impactos” de projetos de energia renovável. Uma fonte confidenciou à Mover que o tema gera algum receio. “Conheço um investidor que desistiu de eólica por causa disso. Vai entrar em solar”.
Olho nos mercados
Com diversos grupos listados em bolsa expostos aos negócios eólicos, como companhias elétricas e industriais, é importante que os investidores brasileiros fiquem atentos aos ventos turbulentos que já aparecem mais fortes no mercado externo e começam agora a chegar por aqui.
A líder nacional em máquinas e equipamentos industriais Romi, por exemplo, viu um tombo de mais de 50% na entrada de pedidos em sua unidade de fundidos e usinados no terceiro trimestre, citando a redução no ritmo de novos projetos eólicos.
Enquanto isso, a Petrobras tem planos de investir em usinas eólicas, tanto tradicionais quanto “offshore”, tema que está em discussão no conselho da estatal justamente neste momento. A companhia inclusive assinou acordo com a fabricante catarinense de equipamentos elétricos WEG para desenvolver maquinário para o setor.
No Hemisfério Norte, porém, a dinamarquesa Orsted acaba de contabilizar US$2 bilhões em perdas após abandonar projetos eólicos offshore nos EUA. A sueca Vattenfall encarou prejuízo de US$540 milhões depois de fazer o mesmo com projetos no Reino Unido. Ambas as companhias, listadas em bolsa, disseram que os custos maiores já não justificavam os negócios.
Como diz o velho ditado, o bom navegador não reclama do vento forte, mas sim ajusta suas velas – então, é bom que o investidor exposto ao setor esteja preparado. O cenário desafiador de curto prazo da energia eólica está em suas planilhas e modelos?