Por Luca Boni e Gabriel Ponte
A inflação voltou ao centro das atenções do mercado financeiro, depois que indicadores mostraram uma aceleração inesperada dos preços, tanto nos Estados Unidos como na Europa. Cenário que desafia a política monetária restritiva já adotada pelos bancos centrais.
Nos Estados Unidos, o núcleo do PCE mensal referente a janeiro mostrou alta de 0,6%. Na Europa, também há sinais de inflação persistente, de acordo com dados divulgados ontem, a inflação ao consumidor na França acelerou 0,9% em fevereiro.
No Brasil, o IPCA-15 de fevereiro divulgado na última sexta-feira, também surpreendeu, ao subir 0,76%, ante o consenso de 0,71%. Resultado que corrobora a perspectiva de que o país descumpra a meta de inflação, de 3,25%, embora o juro real brasileiro lidere a lista dos mais elevados do mundo.
Na América Latina, México, Chile, Peru e Colômbia enfrentam desafio semelhante. Os bancos centrais desses países perseguem metas entre 2% e 3%, e acumulam uma inflação em 12 meses de, respectivamente, 7,91%, 12,3%, 8,66% e 13,25%.
A diferença em relação ao Brasil é que, nesses países, o juro real é baixo, em alguns casos até negativo. Isso dá espaço, portanto, para que o aperto monetário se intensifique.
Dentro da principal economia do mundo, os Estados Unidos registraram a maior inflação nas últimas quatro décadas em junho do ano passado, atingindo seu pico em 9,1% no acumulado em 12 meses. A inflação arrefeceu para 6,4%. Mesmo assim, o nível segue muito longe da meta em 2% ao ano.
Para José Francisco Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator e professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo, a inflação no Brasil decorre de choques de oferta. Por isso, enquanto o efeito do choque não se dissipar, a inflação permanecerá alta, independentemente se a meta de inflação for alterada.
O economista disse que mesmo que ocorra alguma mudança na política monetária ou algum “truque” que afete certos preços, como a desoneração de combustíveis ou cortes na taxa Selic que se encontre altíssimos patamares, os núcleos da inflação não vão ceder e consequentemente a inflação não irá caminhar para a meta.
Estados Unidos
Investidores passaram a ampliar as apostas na chance de a taxa-alvo Fed Funds nos Estados Unidos aproximar-se do patamar de 6,0% ao fim deste ano, em meio à persistência de uma inflação alta no país e dados recentes que indicam a resiliência da atividade econômica americana.
Derivativos negociados na Chicago Mercantile Exchange (CME) no início da tarde desta quarta-feira apontavam que os investidores projetavam 11,5% de chance de alta de 25 pontos-base dos juros na reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto do banco central americano de setembro deste ano, para o intervalo entre 5,75% e 6,0%. Na véspera, as apostas de uma alta para esse patamar estavam em 7,4%. Há uma semana, em 4,4%.
O aumento das apostas vêm na esteira de dados que apontam para preços elevados persistentes nos EUA. O núcleo do índice de preços de Despesas de Consumo Pessoal (PCE) avançou 0,6% em janeiro, na base mensal, acima do consenso de projeções levantadas pela Mover, que previa alta de 0,4%. Em termos anuais, o núcleo foi a 4,7%, ante consenso de 4,3%.
Mais cedo, Neel Kashkari, presidente do Federal Reserve de Minneapolis, disse estar “aberto” a uma alta dos juros de 25 ou 50 pontos-base na reunião de juros de março. Ele é membro votante do comitê do Fed conhecido como FOMC.
A próxima reunião do comitê ocorre nos dias 21 e 22 de março. No início da tarde, investidores projetavam 70,8% de chance de uma alta de 25 pontos-base do juro no encontro. A probabilidade de uma alta de 50 pontos-base estava em 29,2%, segundo a CME.
Dados do mercado de trabalho americano no relatório Payroll e o índice de preços ao consumidor de fevereiro, a serem divulgados nas próximas semanas, ajudarão os investidores a precificarem a magnitude de alta do juro na decisão do Fed deste mês.