Saída para cortes de geração?

Governo prepara leilão de baterias para dezembro; ex-Aneel alerta para risco de "erro terrível"

Governo prepara leilão de baterias para dezembro; ex-Aneel alerta para risco de "erro terrível"
WEG

Por: Luciano Costa

São Paulo, 16/10/2025 – O governo federal pretende realizar, ainda em dezembro, um inédito leilão para contratação de baterias elétricas, de acordo com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que apresentou a ideia ontem como a grande solução para problemas de instabilidade no sistema elétrico, associados ao rápido crescimento de fontes renováveis, como usinas eólicas e solares. Mas um ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) alertou que essa saída pode se revelar um “erro terrível”.

Os investimentos em baterias têm sido defendidos por membros do governo e alguns especialistas como forma de resolver um paradoxo enfrentado atualmente pelo Brasil: o excesso de geração solar durante o dia ameaça sobrecarregar a rede, ou até ultrapassa a demanda, o que exige o desligamento forçado de parques eólicos e fotovoltaicos em diversos momentos, levando à perda de bilhões em faturamento para empresas do setor, como Echoenergia, da Equatorial, CPFL, Engie e outras.

Com sistemas de armazenamento, que poderiam ser viabilizados em leilão, a ideia seria guardar esse excedente para reinjetar na rede no horário de pico de demanda do final da tarde, por exemplo, quando o sol se vai e a geração de energia precisa crescer rapidamente, o que é chamado pelos técnicos de “rampa de carga”– que também aumenta riscos de instabilidade na rede e consequentes blecautes.

“O grande desafio do setor elétrico é o crescimento enorme das renováveis, que cria instabilidade no sistema, no mundo inteiro. Acabou de ter um problema sério na Espanha, em Portugal. Isso só será resolvido com a questão da bateria. Vamos fazer um primeiro leilão de baterias agora em dezembro”, disse o ministro Silveira, ontem, em participação em comissão na Câmara dos Deputados, citando recente blecaute na Península Ibérica que foi associado à dificuldade da rede para lidar com a crescente geração solar e eólica.

Para o consultor e ex-diretor da Aneel, Edvaldo Santana, “o raciocínio é encantador”, e “só se fala no sistema de armazenamento de energia como a melhor opção” para enfrentar os cortes de geração, chamados pelos técnicos de “curtailment”. Mas, se essa é a saída, por que as próprias empresas de energia eólica e solar não instalam baterias para reduzir suas perdas?, questionou.

Ao fazer cálculos que consideram a proporção dos cortes de geração, Santana diz que eles representaram, em setembro, o equivalente ao consumo de todas residências de São Paulo ou do Nordeste, e tendem a crescer, o que exigiria 55 gigawatts em baterias para absorver toda energia hoje “cortada”. No mundo todo, existiam em 2024 cerca de 150 GW instalados nesses sistemas de armazenamento.

“A Empresa de Pesquisa Energética estima que o custo de investir em BESS (baterias) estaria entre R$ 5.000 e R$ 9.500 por kW. Por essa conta, seriam exigidos faraônicos R$357 bilhões, 2/3 disso imediatamente. É uma meta muito ousada, concorda?”, apontou Santana, em artigo no Valor Econômico.

Em outra conta, ele estimou que o “curtailment”, no pior cenário, custaria algo como R$70 bilhões em perdas de faturamento para os geradores em uma década. “Não faz sentido a solução custar oito vezes mais que o problema a ser resolvido. É claramente burrice– uma insanidade”, avisou Santana, um dos primeiros a alertar sobre os riscos de uma proposta da presidente Dilma em 2012 para reduzir as contas de luz que depois causou aumento de tarifas e instabilidade no setor, com impactos financeiros para os consumidores que duram até hoje.

Ele afirmou ainda que, considerando que há outras fontes de energia além das usinas eólicas e solares, como as hidrelétricas, a contratação de um volume massivo de baterias poderia levar a um “resultado incomum”, com “monumental sobra na hora do pico”. “Resultado: gastaríamos uma fortuna apenas para deslocar o curtailment do meio para o fim da tarde”.

EMPRESAS SE PREPARAM
Enquanto o governo sinaliza adiantar o leilão de baterias, que até há poucos dias vinha sendo esperado apenas para 2026, diversas empresas têm se movimentado, de olho em potenciais oportunidades de negócio. A WEG, por exemplo, está colocando os sistemas de armazenamento (BESS) como um de seus novo produtos mais promissores, segundo comentários recentes do CEO, Alberto Kuba.

A chinesa BYD também é esperada como uma potencial fornecedora ou até participante do leilão como investidora– o ministro da Casa Civil, Rui Costa, chegou a convidar a empresa publicamente para o certame ao participar de inauguração de fábrica de carros elétricos da empresa na Bahia.

“Algo maravilhoso, como é a energia solar e eólica, traz instabilidade ao sistema. Para estabilizar o sistema elétrico, precisamos de gigantes baterias”, afirmou ele, durante a cerimônia da BYD, que contou com presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em ocasiões anteriores, o ministro Silveira chegou a projetar uma demanda de até 2 gigawatts no primeiro leilão de baterias do Brasil. Ainda não há uma data para a licitação– geralmente o governo lança processos de consulta pública antes de agendar leilões, e publica o edital com as regras com ao menos 30 dias de antecedência.