´Curtailment´ tem afetado diversas elétricas

Cortes de geração renovável podem ser problema ao menos até próxima década, diz Itaú BBA

Cortes de geração renovável podem ser problema ao menos até próxima década, diz Itaú BBA
Auren

São Paulo, 15/04/2024 – Cortes na geração de energia em usinas eólicas e solares, provocados por limitações na rede de transmissão, devem continuar sendo uma preocupação central para investidores do setor pelo menos até o final da década. A avaliação é do Itaú BBA, que aponta empresas como Auren, Engie, Equatorial e Copel entre as mais impactadas pelas restrições operacionais.

O governo federal iniciou estudos para mudanças na operação do sistema elétrico, com o objetivo de minimizar o problema — que já afeta decisões de investimento e vem preocupando governadores do Nordeste, região com elevado potencial para geração renovável. No entanto, segundo analistas do BBA, mesmo que essas medidas avancem, elas não devem ser capazes de resolver o impasse de forma definitiva.

“Mesmo adotando premissas mais conservadoras, ainda projetamos restrições de geração (curtailments) da ordem de 5% entre 2025 e 2029”, afirmam os analistas liderados por Marcelo Sá e Fillipe Andrade. Em cenários de maior uso da geração hidrelétrica — que compete pelo uso das redes — esses cortes podem ultrapassar 15% em diversos anos.

Em março, os cortes representaram 11,7% da geração total de usinas eólicas e solares, abaixo dos 25% em fevereiro. No primeiro trimestre de 2024, a média foi de 16%, frente a 10% no quarto trimestre do ano passado.

De acordo com o Itaú BBA, em termos absolutos, Auren, Engie, Serena, Equatorial e Copel foram as mais impactadas pelas restrições em março. Em termos relativos (como proporção da geração), os destaques negativos foram Alupar, Serena, CPFL, Equatorial e Auren.

‘CRISE’ NO SETOR

“Vivemos os piores momentos da indústria da energia brasileira. É a primeira vez que vejo uma crise de tamanha dimensão e de longa duração, já que não é uma crise que vai se resolver amanhã”, disse a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Gannoum, em evento em São Paulo nesta terça-feira.

Os cortes de geração, impostos pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para evitar sobrecargas e apagões — como o registrado em agosto de 2023 —, vêm inibindo investimentos em novas usinas. A indústria de equipamentos, incluindo a fabricante de pás eólicas Aeris, enfrenta forte retração por falta de demanda– Siemens e GE fecharam fábricas de turbinas eólicas no Brasil.

Empresas do setor estimam perdas de faturamento próximas a R$ 2 bilhões devido às restrições. Em resposta, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) criou um grupo de trabalho para discutir os critérios aplicados pelo ONS nos cortes. O Ministério de Minas e Energia, por sua vez, tem pressionado o operador a flexibilizar os limites e permitir maior escoamento da energia excedente do Nordeste para outras regiões.

´RISCO DO NEGÓCIO´?

As restrições não são exclusividade brasileira. A China chegou a registrar ‘curtailments’ de até 15% na última década, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), que também cita Chile e Irlanda como exemplos de países afetados por limitações similares. Geralmente, a causa está relacionada à falta de infraestrutura ou falhas regulatórias.

Para Luiz Maurer, da Principal Energy, ex-consultor de energia do Banco Mundial, “não é razoável supor” que as perdas das geradoras elétricas serão repassadas aos consumidores, como pede o setor, e outras medidas possíveis precisariam ser discutidas.

“Uma análise técnica independente sobre o problema de ‘curtailment’ mostra que não é algo novo, não foi inventado no Brasil e era em grande medida previsível”, afirmou.

Ele atribuiu o crescimento das limitações aos fortes investimentos em renováveis, impulsionados em parte pela perspectiva de retirada de alguns subsídios dados ao setor, aprovada pelo Congresso em 2021. Na época da medida, foi dado “prazo de transição” até o fim do benefício, que acabou na prática acelerando ainda mais investimentos. O prazo ainda seria novamente postergado em 2024, por Medida Provisória.

“Os agentes, por livre e espontânea vontade, decidiram investir massivamente sob esta situação de risco, conhecendo os sinais perversos do sistema. Tudo indicava que haveria sobrecapacidade e canibalização entre renováveis. Não é portanto correto afirmar que os agentes não tiveram qualquer controle sobre a situação em que agora estão imersos. Eles ajudaram a criar esta situação”, disse Maurer.

(LC | Edição: Luca Boni | Comentários: equipemover@tc.com.br)