Exclusivo

Belo Monte: procuradores sugerem arquivar processo sobre cartel de empreiteiras

Belo Monte: procuradores sugerem arquivar processo sobre cartel de empreiteiras

São Paulo, 26/04/2024 – Procuradores federais estão recomendando o arquivamento de um processo aberto pelo órgão de defesa da concorrência, Cade, para apurar e punir construtoras envolvidas nas obras da hidrelétrica de Belo Monte, por acusações de formação de cartel que haviam sido admitidas anteriormente por representantes de ao menos uma das empresas, segundo parecer visto pela Mover.

O processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) sobre possíveis irregularidades na usina do rio Xingu, que tem a Eletrobras como principal acionista, foi aberto ainda em 2016, no auge da chamada Operação Lava Jato, e mirava as empreiteiras Camargo Corrêa e Odebrecht, além de ex-executivos das empresas, após acordo de leniência em que delatores da Andrade Gutierrez teriam exposto as práticas.

Investigações foram realizadas, e a Superintendência-Geral do Cade chegou a recomendar ao Tribunal do órgão, em 2022, a condenação de pessoas físicas envolvidas e das construtoras Odebrecht e Camargo Corrêa, que ficariam sujeitas a pesadas multas de até 20% do faturamento.

Mas um ano depois, e já sob novo governo, em agosto de 2023, o superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto de Souza, atendeu pedido do relator e determinou diligências complementares, que agora foram reunidas e avaliadas pela procuradoria federal especializada junto ao CADE.

Depois, em parecer com data de 11 de abril, o procurador federal Antonio Marcos Guerreiro Salmeirão entendeu que a acusação contra Odebrecht e Camargo Correia se baseava apenas em relatos de colaboradores e indícios que segundo ele não foram comprovados de modo a levar o caso adiante.

“Com efeito, os elementos trazidos pelos beneficiários do Acordo de Leniência não foram capazes de demonstrar suposto conluio entre as representadas com o fim de prejudicar ou limitar a concorrência”, escreveu o procurador.

“As afirmações acerca dos fatos investigados não foram comprovadas segundo o lastro probatório reunido nos autos, que se apresenta insuficiente para demonstrar prática de infração contra a ordem econômica”, acrescentou o parecer, referendado pela procuradora-chefe do Cade, Juliana Domingues.

HISTÓRICO

A hidrelétrica de Belo Monte, que demandou mais de R$35 bilhões, foi licitada em 2010, e na época participaram do leilão dois consórcios com elétricas e empreiteiras. Mas, no acordo de leniência, delatores da Andrade Gutierrez disseram que houve formação de cartel desde antes do pregão, com conluios e combinações de propostas, “com vistas a repartir a contratação para a construção da hidrelétrica” posteriormente.

Disputaram Belo Monte um grupo formado por Eletrobras Furnas, Eletrosul, Andrade Gutierrez, Vale e Neoenergia; e outro, que venceu, a Norte Energia, com Eletrobras Chesf, Queiroz Galvão e Galvão Engenharia, além de empresas menores.

Camargo Corrêa e Odebrecht não entraram na concorrência, alegando desentendimentos sobre as tarifas. Depois do pregão, no entanto, a Norte Energia convocou todas as antes rivais para negociarem participação no consórcio construtor.

Segundo os delatores, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht teriam então alinhado suas ofertas, mantendo combinações iniciadas ainda antes do leilão de forma a garantir que as três dividiriam as principais contratações para as obras.

Ao analisar o processo, no entanto, o procurador entendeu que houve “competitividade intensa” entre as três empreiteiras pela liderança do grupo de construtoras, o que no final teria levado a uma redução de R$2 bilhões no valor final dos serviços, que ficaram com a AG, por R$13,4 bilhões.

Procuradas por meio de assessores, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht não quiseram comentar, e o Cade disse que não comenta casos em andamento. A Norte Energia não retornou de imediato.

‘SEM PROVAS’

Segundo o parecer da procuradoria no Cade, “não seria razoável esperar que as construtoras que pretendiam executar a obra conjuntamente.. não discutissem e avaliassem o contingenciamento de riscos”, mas não haveria provas de combinação de valores.

“Dessa maneira, observa-se que não há nos autos evidências de acordo para aumentar preços e de adoção de estratégias para excluir concorrentes, tendo sido preservada a competitividade do procedimento de contratação da execução da obra de Belo Monte”, defendeu o parecer, que foi encaminhado ao gabinete do relator do caso no Cade.

“A similaridade de valores das propostas da Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, todas apresentadas de forma autônoma e independente, justifica-se pelo fato de as empresas possuírem uma mesma base de estudos técnicos, realizados em conjunto pelas empresas ao longo de anos”, justificou a procuradoria do Cade no parecer.

(LC | Edição: Luca Boni | Comentários: equipemover@tc.com.br)