Por: Bruno Andrade e Leandro Tavares
Os chamados juros do rotativo de cartão de crédito são um tema “muito complexo”, mas o Banco Central está buscando o entendimento entre todos os agentes a respeito do assunto, afirmou hoje o presidente da autoridade, Roberto Campos Neto, durante participação em evento do jornal Valor Econômico.
“O problema é que demoramos muito tempo para entender o mundo dos meios de pagamentos. Queremos achar uma solução sem criar nenhum tipo de ruptura no consumo, sem prejuízo para consumidores e lojistas”, disse.
Segundo Campos Neto, o uso do parcelado sem juros aumentou bastante, bem como a quantidade de emissões de cartões e os limites. Por isso, houve aumento da inadimplência, principalmente entre o público que tem mais cartões.
“Se o mercado [os bancos] não chegar a um entendimento, a lei aprovada recentemente vai limitar automaticamente os juros do rotativo, mas com um impacto pequeno nas taxas cobradas atualmente”, disse o presidente da autoridade monetária.
De acordo com o projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado, caso não haja entendimento entre os bancos, a proposta é estabelecer um limite de 100% para os juros do rotativo do cartão de crédito.
Nas últimas semanas, os presidentes dos quatro grandes bancos com capital aberto em Bolsa, Itaú, Santander, Bradesco e Banco do Brasil, defenderam o parcelado com juros em detrimento do parcelado sem juros para compensar o limite de 100% para os juros do rotativo.
De acordo com o CEO do Santander, Mario Leão, o diagnóstico do governo de que as taxas são realmente altas está correto, mas ele pediu um debate “técnico e com equilíbrio” sobre o tema.
Ele defendeu que a solução passe por um maior uso do parcelamento com juros nas compras no cartão, em detrimento de parcelamentos sem juros hoje bastante comuns. “A limitação em até 12 vezes é uma matemática que não funciona, existem compras feitas com parcelamento em 6 vezes, ou até 4 vezes”, disse ele ao reclamar da proposta inicial do BC de permitir compras parceladas sem juros em até 12 vezes.
Já o discurso do presidente do Itaú Unibanco, Milton Maluhy Filho, está bem alinhado com o de Campos Neto. Ao ser questionado pelo Faria Lima Journal (FLJ), Maluhy Filho negou defender o fim do parcelamento sem juros, mas comentou que o cartão de crédito pode ser complicado para quem tem menos poder aquisitivo.
“O parcelado sem juros é um grande impulsionador da inadimplência no médio prazo, pois ele dá um grande poder de compra para o consumidor que acaba parando nos juros do rotativo do cartão”, afirmou.
Do outro lado, as pequenas e médias empresas do setor bancário são totalmente contrárias a qualquer regulação do parcelamento sem juros. Segundo o CEO do Banco Pan, Carlos Eduardo Guimarães, a proposta do governo de limitar os juros do rotativo do cartão em 100% é aceitável, mas ele é contrário em colocar qualquer regulação sobre o parcelamento sem juros.
“Defendemos que o mercado deve ser livre. Se o meu banco oferece um juros muito menor que o do concorrente, basta o cliente fazer uma troca de bandeira. Acho que a defesa do livre mercado é o melhor caminho”, disse Guimarães.
Na coletiva desta sexta-feira, Campos Neto disse que não está pessimista em relação ao fechamento de um possível acordo, mas que o cenário é complicado.
“Nós temos dois grupos, um não quer negociar se não tiver uma mudança no número de parcelas e outro grupo acha que isso não é viável. Temos que tentar encontrar uma solução intermediária, mas não vou dizer se estou pessimista ou não porque ainda estamos trabalhando nisso”, declarou
O Banco Central tem como data limite para fechar o acordo até o dia primeiro de janeiro de 2024. Após a decisão do BC, Campos Neto fará uma reunião com o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e a Ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), cada um dos três terá direito a um voto no Conselho Monetário Nacional (CMN), que definirá o futuro do parcelado sem juros. Haddad e Tebet não se pronunciaram sobre o assunto até o momento.