Por: Luciano Costa e Leonardo Levatti
São Paulo, 10/10/2025 – O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, indicado ao posto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem conquistado credibilidade perante agentes do mercado com um discurso duro, após preocupações iniciais de que poderia acelerar a queda de juros, mas ainda não convenceu o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman, um conhecido “hawk” — termo usado para descrever aqueles que priorizam o controle da inflação sobre o estímulo ao crescimento ou à geração de postos de trabalho.
Lembrando artigos escritos por Galípolo e declarações passadas heterodoxas, em contraposição ao tom hoje mais alinhado a economistas liberais, Schwartsman citou um filme do diretor americano Woody Allen, “Zelig”, para descrever o presidente do BC como um “camaleão humano”.
No filme de 1983, um documentário ficcional, o personagem de Allen, Leonard Zelig, alcança notoriedade pela capacidade de modificar modos e até aparência para agradar outras pessoas, de acordo com o ambiente.
“O Galípolo é meio isso, ele é meio Zelig. Ele não caiu do céu… ele escrevia com o Luiz Gonzaga Belluzzo. E eu tive paciência de ler aquilo, de debater. Um pouco antes do governo Lula, ele foi co-autor, com o André Lara Resende, de uma série de propostas de política monetária…e tinha coisas fantásticas, como dar assento para o BNDES no Copom… depois que ele foi para o BC, ele tem uma postura mais comedida”, afirmou Schwartsman, em participação na TC News.
“Já saímos do domínio da economia, estamos falando aqui no domínio da psicoterapia, não é exatamente minha especialidade. Mas é isso que ele faz, ele adapta o discurso ao público que ele está falando naquele exato momento”, disse o ex-BC.
“O público do mercado financeiro tem uma desconfiança enorme dele, que foi caindo ao longo do tempo… ele faz um esforço para se mostrar duro, hawkish.. mas eu tive um professor de economia que dizia que o teste do macarrão consiste em colocá-lo na água e ver se ele amolece ou não”, brincou Schwartsman.
“Vamos ver isso na virada do ano. Eu não deixei de desconfiar do Galípolo, não”, acrescentou o economista.
As preocupações do mercado com Galípolo remetem ao histórico do presidente do BC durante governo Dilma Rousseff, Alexandre Tombini, que utilizou o cenário internacional conturbado em 2011, pós-crise financeira de 2009, como argumento para um “cavalo de pau” na política monetária, reduzindo juros agressivamente enquanto a inflação rodava fora da meta.
Ao falar sobre Galípolo, Schwartsman citou trabalhos feitos por ele com nomes conhecidos de linhas heterodoxas da economia, e declarações em eventos organizados por entidades mais voltadas à esquerda.
Em livro escrito com Beluzzo e lançado em 2019, por exemplo, rasga elogios a Karl Marx, enquanto critica a “riqueza capitalista e o avanço do rentismo”.
“Tem muita história que as pessoas ignoram a seu risco, a seu bel-prazer. Vai lá, lê essas coisas, lê o que ele escreveu com o André Lara, com o Beluzzo. Porque, naquele momento, ele não estava sob escrutínio público, e agora ele está”, acrescentou Schwartsman.
Beluzzo, doutor em economia pela Unicamp, onde é professor, foi incluído em um ranking de “100 maiores economistas heterodoxos do século XX”, com forte influência de John Maynard Keynes.
Já Lara Resende, economista da PUC-Rio, foi um dos pais do Plano Real, mas mais recentemente passou a questionar a “ortodoxia monetária”, aproximando-se de correntes como a Teoria Monetária Moderna (MMT)– que defende que governos que emitem sua própria moeda, e têm dívidas denominadas nessa moeda, podem trabalhar com déficit público sem maiores problemas.