Fed deve manter discurso duro com atividade forte nos EUA, diz Damont Carvalho, da Principal Claritas

"Fed tem um certo conforto para continuar com discurso mais duro”, diz gestor

Reprodução/X
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Por: Juliana Machado

*A entrevista com Damont Carvalho, da Principal Claritas, foi realizada em 13 de novembro de 2023

Com a economia dos Estados Unidos ainda demonstrando força, o Federal Reserve deve manter um discurso mais duro em relação ao momento de iniciar a flexibilização monetária. Apesar da boa evolução de diversos dados econômicos necessários para que haja corte de juros, como a inflação, o ritmo ainda firme da atividade americana deve fazer o Fed manter o tom menos afrouxado, afirma Damont Carvalho, gestor da Principal Claritas.

“Quando temos os dados de atividade ainda firmes e mostrando que economia americana está pujante, mas o mercado de trabalho está desacelerando na margem e com números de inflação vindo mais fracos, o Fed tem um certo conforto para continuar com discurso mais duro”, disse ele, em entrevista à Mover.

Confira a seguir os principais pontos da entrevista.

CRESCIMENTO DOS EUA

Nos últimos 30 dias, [o rendimento das] Treasuries bateram 5% com o Fed em discurso duro. O que fez o mercado mudar nesses últimos 30 dias é que o Fed deixou mais claro, e o Jerome Powell [presidente do Fed] falou isso claramente, que as condições financeiras tinham apertado recentemente e isso era equivalente ao papel de um possível novo aumento do juro americano.

Mas, desde que ele falou isso, aconteceu o inverso, as Treasuries saíram de 4,9% para 4,50% e 4,60%, e o S&P500 voltou a se valorizar. O que a gente acredita é que o Fed está monitorando os dados correntes e números mais fracos de emprego e inflação, que permitem um corte de juros a partir do ano que vem, mas os números de atividade ainda fortes deixam o Fed um pouco mais hawkish [inclinado à alta de juros].

Houve uma aceleração do PIB [Produto Interno Bruto] do segundo trimestre para o terceiro trimestre lá fora e isso surpreendeu positivamente pela atividade em si, mas negativamente pelo Fed, que teve que ter um discurso mais hawkish.

TREASURIES

Como a atividade está muito resiliente e entramos em ano eleitoral em 2024, com gastos mais altos, a necessidade de financiamento do déficit público americano continua bastante forte, o Tesouro não vai parar de emitir e captar. O que acontece é que a curva [de juros americana] está bem justa para esse cenário de inflação mais calma, emprego com leve alta e atividade de lado.

A gente acredita que, agora, para o mercado precificar mais e antecipar mais cortes de juros pelo Fed a partir do ano que vem, precisamos ver a atividade desacelerando mais. Não é mais o desemprego e o CPI [índice de preços ao consumidor americano], é a atividade mostrando fraqueza.

BRASIL E ATIVOS DE RISCO

Esse cenário favorece ativos de risco, inclusive o Brasil. Ao longo de outubro, a gente chegou a precificar uma Selic terminal em 11% e o mercado agora está abaixo de 10% novamente, como resultado de uma inflação bastante bem comportada no Brasil.

Nossa leitura de atividade parou de acelerar na margem. Esperamos 3% de PIB este ano e 1,6% ano que vem. Os números de inflação e de atividade, na margem, mais fracos em conjunto com um cenário lá fora mais calmo, sacramentam uma Selic terminal abaixo de 10%. Nossa previsão é de 9,5%, que ainda é bastante restritiva.

De todo modo, com a curva de juros longa voltando a cair, um PIB melhor, dados de desemprego melhores, inflação saindo de 6% para 4,5%, câmbio bem comportado, temos um ambiente para se comemorar no Brasil e por isso estamos mais construtivos com ativos brasileiros hoje do que há um tempo atrás.

FISCAL

Não espero que o governo vá conseguir atingir um déficit zero ano que vem, nosso número já era de -0,8% do PIB, mas não importa: é preciso manter o foco em tentar cumprir a meta. O que a gente precisa é de uma tentativa de corte de despesas ou aumento de receitas, sem que o governo incentive romper com isso. O ambiente fiscal sem dúvida acaba restringindo a Selic terminal.

O importante do déficit zero é que, se o governo falhar e atingir um déficit de 0,5%, mas isso for resultado de uma frustração nas receitas e sem aumento de despesas, faz parte do jogo. O que não pode é ter aumento de gastos. Com esse ambiente, o Banco Central ficaria satisfeito em ver que o Ministério da Fazenda e o governo estão fazendo o seu papel, com espaço para uma Selic terminal mais salutar para o país, em um nível mais baixo e que efetivamente consiga impulsionar a atividade.

Esta reportagem foi publicada primeiro no Scoop, às 13h55, exclusivamente aos assinantes do TC. Para receber conteúdos como esse em primeira mão, assine um dos planos do TC.

(JM | Edição: Luciano Costa | Comentários: equipemover@tc.com.br)