São Paulo, 1/11/2024 – Operações no mercado livre de energia, em que grandes empresas negociam contratos e preços diretamente com grupos de geração e comercializadoras de eletricidade, estão travadas nos últimos dias, praticamente sem liquidez, por temores de uma nova onda de inadimplência, disseram à Mover/Faria Lima Journal diversas fontes do segmento.
A preocupação aumentou depois que começaram a circular informações sobre dificuldades financeiras de uma das cinco comercializadoras de energia com maior volume negociado, a Gold, de acordo com as fontes, que pediram anonimato devido à sensibilidade do assunto.
A Gold, que pertence a um ex-sócio da área de energia do BTG Pactual, Cassiano Agapito, e até recentemente tinha como acionista o investidor James Oliveira, da gestora Vinland Capital, está tentando negociar com contrapartes para reduzir obrigações e conseguir sobreviver, disseram as fontes. Não foi possível falar com representantes da Gold de imediato. Agapito e Oliveira não responderam a tentativas de contato.
Nos últimos meses, algumas outras comercializadoras sinalizaram problemas financeiros, mas eram empresas menores. Os temores quanto ao risco de calotes aumentaram primeiro com uma crise da 2W Ecobank, de maior porte, que está negociando com credores recuperação extrajudicial, e agora com a Gold, porque essa última cresceu bastante recentemente.
“A bola da vez é a Gold. Está tendo burburinho porque eles são grandes. Por conta dessa, situação a liquidez caiu bastante”, disse uma fonte do mercado elétrico à Mover.
“Praticamente zerou (a liquidez no mercado). Ninguém está fazendo nada”, disse uma segunda fonte. “Se for isso, será a maior quebra do setor”.
MERCADO DE GRANDES GRUPOS
O mercado livre de energia é liderado por empresas de grandes grupos, como os bancos BTG e Santander, além de elétricas, como Auren, Copel e EDP, e até corretoras como a XP. Em agosto, a Gold foi a quinta em volumes, segundo ranking da ePowerBay, com mais de 4 gigawatts médios em operações de compra e venda de contratos. Para algumas das fontes, o crescimento das operações não foi acompanhado da prudência necessária.
As preocupações com possível aumento da inadimplência que drenaram a liquidez do mercado nos últimos dias lembram eventos de alguns anos atrás. Em 2019, várias empresas menores de comercialização de energia quebraram, criando efeitos em cadeia no mercado, e gerando perdas para diversas empresas do setor, após apostas erradas nos movimentos de preços de eletricidade.
No mercado elétrico, quando há inadimplência, os contratos podem ser suspensos, arriscando gerar um ´efeito dominó´ entre contrapartes de empresas com dificuldades, que seriam obrigadas a recomprar energia, possivelmente a preços maiores.
Uma das fontes disse que a Gold teria levado “duas invertidas” em operações comerciais em que assumiu riscos de clientes, prejudicado a posição de caixa, mas estaria correndo atrás de resolver a situação– se tudo der certo, poderia ser “um susto”, sem necessariamente levar à quebra da empresa.
Órgão que registra os contratos no mercado de energia e contabiliza as operações no setor, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) teria avisado algumas contrapartes da Gold que a empresa entrou “em contingência”, ou seja, passou a operar sob monitoramento mais estrito, segundo uma das fontes. Procurada, a CCEE não comentou de imediato.
Entre companhias com subsidiárias de comercialização de energia estão Eletrobras, Engie, Copel, Alupar e outras elétricas, empresas como Vibra e Raízen, e bancos, incluindo ABC Brasil, e mais recentemente Bradesco.