Quando o economista Armínio Fraga instituiu o regime de metas de inflação, em 1999, ele teve dúvidas sobre incluir ou excluir os preços administrados do índice de preços calculado. Preços administrados são de serviços e produtos cujos valores são definidos por contratos ou regulados pelo setor público – gás, gasolina e eletricidade, entre outros. Aos jornalistas que o perguntavam, ele respondia que, embora retirar esses preços do índice fizesse sentido, o sistema perderia a credibilidade. O brasileiro, dizia ele, confiava no IPCA cheio e desconfiaria que qualquer alteração poderia ser vista como manipulação.
Hoje, 24 anos depois, os preços administrados voltam ao cardápio de medidas, junto a outras alternativas, para alterar as metas de inflação.
Fabrício Silvestre, economista do TC/Economática, diz que 37 itens medidos pelo IPCA são preços administrados. E reconhece que é legítimo o dilema entre perseguir o centro da meta ou a meta cheia. “Essa é uma das limitações do regime de metas de inflação. Quando a gente tem uma inflação um pouco mais alta, especialmente em preços administrados, como tivemos nos anos passados, principalmente com relação ao preço da Gasolina, o Banco Central precisa penalizar um pouco mais os preços livres.” Silvestre, no entanto, ressalva que os Bancos Centrais também observam o peso dos preços administrados ao estabelecerem os juros.
Quem conhece a história do regime de metas de inflação desde sua concepção vê uma diferença entre os dois momentos. Diferentemente daquele governo, o atual não manifesta qualquer temor em destruir a confiança que a população como um todo deposita no índice. Traduzindo: ao tirar os preços controlados do IPCA (hoje, eles respondem por 24,71% do índice), o governo forçaria o Banco Central, que hoje é autônomo, mas precisa perseguir as metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional, a manter juros mais baixos.
Outra saída no cardápio do ministro Haddad seria dar mais prazo para o Banco Central atingir a meta – de um ano para dois, por exemplo. Em outras palavras, aumentar os intervalos de tolerância.
A maioria dessas medidas dependeria de alteração do Congresso, mas vale dizer que, para este tema, há projetos para todos os gostos. Os que mais apetecem o governo são aqueles que estipulam, como metas a serem perseguidas pelo BC, as de suavizar as flutuações econômicas e de promover o pleno-emprego.
A última opção seria simplesmente aproveitar a maioria que o governo dispõe no Conselho Monetário Nacional, cuja próxima reunião é no próximo dia 26, e criar mais válvulas de escape para forçar o BC a manter um patamar menor de juros. Seria uma medida de força. O governo sabe disso. Certamente seria rejeitada pelos mercados, mas o governo um bom álibi para fazê-lo: uma alta mundial nos preços sobre a qual um endurecimento da política de juros não faria sentido.