Por Marcio Aith e Luciano Costa
O governo federal trabalha para construir um arcabouço legal que possa acelerar e fomentar investimentos em novas fontes renováveis, como usinas eólicas offshore, instaladas no mar, e hidrogênio verde, disse ao Faria Lima Journal (FLJ) o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD-MG).
“Além da Petrobras, temos trabalhado junto ao setor privado nessas áreas, e são muitos projetos potenciais que vamos destravar”, disse Silveira, em entrevista exclusiva ao FLJ.
A importante pasta de Minas e Energia, que foi por longos anos comandada por nomes ligadas ao MDB, não aparece entre aquelas cogitadas para mudanças, e o mineiro Silveira parece estar bem alinhado a Brasília, com planos que falam em usar tecnologias verdes para “reindustrialização” e para tornar o país um “exportador de sustentabilidade”.
“A relação com o presidente Lula é a melhor possível. O presidente sabe muito bem da importância dos setores para o desenvolvimento econômico e social do país, além de se apresentar como um grande líder dos países do sul global na transição energética. O presidente também reconhece o papel de destaque do país como o grande celeiro mundial em energias limpas e renováveis”, afirmou Silveira.
Parques eólicos, que geram energia a partir do vento, movimentaram mais de US$40 bilhões em investimentos no Brasil desde um primeiro leilão federal, em 2009, no segundo mandato de Lula. Mas o Brasil ainda não possui eólicas no mar, tecnologia que começou a se desenvolver na Europa e agora atrai ambiciosos planos de China e Estados Unidos.
O hidrogênio verde, outra grande tendência global em renováveis, também está entre as prioridades no país, e há até iniciativas em andamento aqui– a Unigel tem um projeto inicial em Camaçari, na Bahia, para o qual negocia inclusive possível parceria com a Petrobras.
Essa foi a segunda parte da entrevista exclusiva de Silveira para o Faria Lima Journal. Para ler a primeira parte, basta clicar aqui.
Confira, a seguir, a entrevista com o ministro Alexandre Silveira.
FLJ – A Petrobras tem falado em investir em usinas eólicas offshore ou hidrogênio, mas essas tecnologias ainda não estão regulamentadas no Brasil. O governo tem planos de acelerar a definição dessas legislações?
O aprimoramento legal e regulatório é uma das prioridades na nossa agenda de transição energética, que é um pilar do governo do Presidente Lula.O Ministério de Minas e Energia está trabalhando e dialogando para contribuir no arcabouço regulatório necessário para que essas duas tecnologias sejam desenvolvidas no território nacional.
Mas não basta só ter as regras. Por isso, temos também interagido com a Aneel, a EPE, o Ibama, outros ministérios e órgãos públicos federais para o desenvolvimento de capacidades institucionais necessárias para que essa regulação tenha efetividade. Para isso, estamos contando com o apoio de projetos de assistência técnica disponibilizados por meio de cooperação técnica com o Banco Mundial. Cooperações entre o Brasil e outros países também estão promovendo ganho de maturidade sobre o tema.
FLJ – O que falta para avançar em eólica offshore?
No caso da energia eólica offshore, foi identificada a necessidade de estabelecer o regramento para a cessão das áreas offshore, que são de domínio da União, para que esses projetos possam ser instalados. O país já dispõe de alguns instrumentos normativos que tratam desse tema, mas para dar mais segurança jurídica para os investimentos, entendemos que é preciso avançar mais na regulamentação dessas atividades.
FLJ – E no hidrogênio?
Vejo como imprescindível estabelecer diretrizes legais para dar maior clareza sobre o papel de cada instituição e a formatação do mercado de hidrogênio de baixo carbono no país. Hoje é uma prioridade do MME construir uma proposta sólida para essa regulamentação, e estamos fazendo por meio da governança do Programa Nacional do Hidrogênio, com os diversos ministérios interessados e outras instituições.
O país tem uma imensa potencialidade para se tornar um dos mais competitivos mercados do mundo para o hidrogênio de baixo carbono, apoiando a neoindustrialização do país e se consolidando como um exportador de sustentabilidade.
FLJ – Sendo tecnologias ainda caras, o governo está discutindo algum subsídio?
A tendência do custo dessas tecnologias é cair e o interesse das empresas por essas novas tecnologias demonstra que há espaço para avançar.
O Ministério de Minas e Energia está focado em planejar e implementar a infraestrutura necessária para viabilizar esses projetos, como por exemplo com um ambicioso plano de investimentos em transmissão. No mês de junho realizamos já o maior leilão desse tipo no país, e vem mais por aí. Os mais de R$ 50 bilhões em investimentos em transmissão desse plano vão destravar pelo menos R$ 150 bilhões em geração renovável altamente competitiva. Isso é um dos principais insumos para a produção de hidrogênio, por exemplo.
Também estamos focando, em parceria com os demais ministérios para atrair para a nossa transição energética recursos de fundos internacionais, apoio de bancos de fomento e de desenvolvimento. Recentemente, em parceria com a Fazenda, aprovamos um plano de investimentos junto ao Fundo de Investimento Climático, com foco na integração de energias renováveis e hidrogênio.
Além disso, estamos mobilizando um volume crescente de recursos para projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação, ação essencial para reduzir custos e riscos dessas novas tecnologias. A Aneel, por exemplo, está em vias de abrir uma chamada estratégica para projetos de hidrogênio com recursos expressivos, o que vai ajudar a movimentar esse mercado.
Enfim, estamos debruçados sobre as diversas tecnologias e modelos de negócios, para mapear as barreiras e oportunidades. Onde houver necessidade, atuaremos. O mercado de carbono também poderá reforçar o ganho de competitividade desses novos negócios.
FLJ – O MME tem planos de realizar leilões para eólicas offshore ou hidrogênio verde?
Temos que construir os instrumentos que sejam efetivos e que não onerem excessivamente as brasileiras e brasileiros. Antes de mais nada, precisamos focar no aprimoramento da regulação, tê-la bem estruturada, o que é uma prioridade nossa.
Além disso, a lógica de leilões do setor elétrico tem evoluído muito nos últimos anos e precisamos construir novas fórmulas para evitar acumular mais distorções no setor energético. O que queremos é pavimentar o caminho para investimentos, criação de empregos e renda e redução das desigualdades no nosso país.
FLJ – E em combustível de aviação verde, o MME tem planos?
Uma das grandes inovações do programa Combustível do Futuro, que será apresentado em breve ao Congresso Nacional, é a de justamente ir além e buscar descarbonizar também o transporte aéreo brasileiro a partir do uso do Combustível Sustentável de Aviação (SAF, em inglês). Um combustível que pode ser feito a partir de resíduos de etanol, dentre outras matérias-primas, que permitirá uma redução de até 75% das emissões de CO₂.
Reconhecendo o potencial brasileiro de produção de 9 bilhões de litros por ano, nossa proposta é colocar mais uma vez o país no protagonismo desse processo, como um grande exportador de SAF, ao invés de só exportar commodities para que os combustíveis sustentáveis sejam produzidos em outros países.
O Combustível do Futuro também prevê ações voltadas para o Diesel Verde, para promoção da descarbonização do ciclo diesel e da redução das importações do diesel, o que contribui sobremaneira para autossuficiência do País e o chamado “E30”, que pretende aumentar o teor de etanol na gasolina, dos atuais 27,5% para 30%.