Por Reuters
O governo federal endureceu as normas para circulação de armas no país, com a edição de um decreto, nesta sexta-feira, que traz uma ampla restrição no acesso, registro e porte, além de transferir do Exército para a Polícia Federal a fiscalização do armamento e munição.
As medidas representam uma reversão da política de ampliação do acesso a armas colocada em prática pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, e era uma das promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Uma coisa é um cidadão ter uma arma em casa de proteção e garantia… mas a gente não pode permitir que haja arsenais de armas nas mãos das pessoas”, disse o presidente durante o evento de apresentação das medidas. “A gente vai continuar lutando por um país desarmado. Quem tem que estar bem armado é a polícia brasileira, são as Forças Armadas brasileiras.”
O texto corta o número de armas que poderão ser adquiridas por civis, incluindo os chamados CACs — Caçadores, Atiradores e Colecionadores –, revertendo a brecha usada por Bolsonaro para aumentar a permissão para posse de armas sem ter que reverter a lei que restringe o porte no país.
No caso do porte para defesa pessoal, o novo decreto reduz de quatro para duas as armas permitidas, e as munições, de 200 por arma por ano para 50. Também volta a ser exigida a comprovação de “efetiva necessidade”.
Já os caçadores deixam de ter acesso a até 30 armas, inclusive de uso restrito, para terem direito a apenas seis, com 500 munições por ano e a exigência de autorização do Ibama.
Atiradores esportivos passarão a ter que comprovar treinamento e competições ao longo do ano, e a quantidade de armas que poderão ter estará relacionada ao grau de treinamento. No nível mais alto, poderão ter até 16 armas, mas terão que comprovar a participação em pelo menos seis competições por ano, sendo pelo menos duas em nível nacional e internacional.
A nova regulamentação remonta a parâmetros de 2018 sobre armas curtas. Pistolas 9mm, ponto 40 e ponto 45 voltam a ser de uso restrito às forças de segurança.
O decreto não prevê a necessidade de entrega ou destruição das armas, permitindo que os donos mantenham seus acervos e abrindo um programa de recompra, com foco nas armas de uso restrito, que teve ter um orçamento em torno de 100 milhões de reais. O texto, no entanto, restringe a possibilidade de circulação de pessoas armadas e impede a aquisição de novas, especialmente as de uso restrito.
Além disso, reduz o prazo de renovação de registro, hoje em 10 anos, para cinco e três anos, a depender do tipo de armamento.
“Ter uma arma é um ônus que quem quiser terá que arcar”, disse o ministro da Justiça, Flávio Dino.
Uma das mudanças feitas pelos decretos de Bolsonaro havia criado um porte de trânsito que, em tese, deveria ser usado apenas para o caminho entre a residência e o local de caça ou tiro desportivo, mas era usado pelos CACs para circularem armados.
O texto agora prevê a emissão de uma guia de trânsito por um período determinado, com trajeto pré-estabelecido e apenas com a arma sem munição.
O novo texto ainda transfere o controle sobre registro e a fiscalização de armas para a Polícia Federal. O registro de armas, que era feito pela PF, havia passado para o Exército durante o governo Bolsonaro, agora volta para a PF. Dados levantados pelo governo mostraram que houve problemas no acompanhamento dos registros pelos militares, o que teria facilitado a aquisição de armas por pessoas ligadas ao crime organizado registradas como CACs.
A Polícia também passará a fazer a fiscalização dos CACs, que ficava sob o comando do Exército, em um processo a ser concluído em 180 dias, explicou Dino, através de um acordo de cooperação. “Haverá uma migração integral de tudo que se refere aos CACs”, afirmou.
Ficará com os militares, segundo o ministro, o “atacado” do mercado de armas, incluindo a fiscalização e autorização de fábricas, a importação, a exportação, e o controle de armas de uso restrito das Forças Armadas e polícias e de produtos controlados.
Um recadastramento feito pelo Ministério da Justiça chegou a 939 mil armas registradas, seis mil a mais do que constavam nos registros do Exército. Dessas, 44 mil são de uso restrito.