Por Machado da Costa, Stéfanie Rigamonti e Simone Kafruni
De um lado, a agenda de Luiz Inácio Lula da Silva (PT): salário-mínimo, reforma do Imposto de Renda, dar uma nova cara ao Copom, barateamento da Taxa de Longo Prazo do BNDES. De outro, a de Fernando Haddad (PT): reforma tributária do consumo, voto de qualidade no Carf e nova âncora fiscal.
Onde residem os problemas: elas são pouco complementares e presidente e ministro da Fazenda ainda não conseguiram afinar o discurso para demonstrar quais são as prioridades.
O primeiro tem caráter absolutamente político, enquanto o segundo sempre que contrapõe o primeiro faz lembrar a frase “quem venceu as eleições fui eu” de Lula.
Há duas semanas, quando o Scoop relatou que haveria um encontro entre Haddad e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para alinhar a indicação de nomes para as diretorias do BC e que essa reunião seria um indicativo para entender qual o poder de decisão do ministro, não se imaginava que a deterioração das expectativas aconteceria tão rápido.
Hoje, uma notícia do Broadcast informa que Lula se decidiu. Quer nomes que se contraponham a Campos Neto após as últimas manifestações do Comitê de Política Monetária, de que juros permanecerão em 13,75% por mais tempo justamente pela desancoragem das expectativas de inflação gerada pelo governo.
Pouco depois, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, deu outra pancada na autoridade monetária: “A nota divulgada pelo Bacen está muito mais crítica ao governo do que acontecia no ano passado, quando o Banco Central não deu um pio sobre as façanhas orçamentárias de Bolsonaro para se reeleger. Aliás, o ‘mercado’ também aquiesceu.” Virou um “nós contra eles”. O “nós” é o PT. O “eles” é o BC.
Pouco mais de um mês da posse e fontes no Congresso já relatam uma bateção de cabeças em torno das prioridades de Haddad e de Lula. Há uma sensação maior de pessimismo em relação ao governo. Se essa aparente resistência do BC contaminar também o Congresso, o ano poderá ser de muito ruído político e poucos avanços legislativos.
Os relatos dão conta de que Lula já queimou boa parte de seu capital político ao aprovar a PEC da Transição. Agora, ao confrontar o Banco Central por conta das decisões do Comitê de Política Monetária, ao reclamar de marcos recentes, como a TLP do BNDES, o do saneamento e a reforma trabalhista, a resistência parece aumentar rapidamente no Congresso.
O termômetro será a aprovação do voto de qualidade do Conselho de Administração de Recursos Fiscais, o Carf, proposto por Haddad e que tramita no Congresso por meio de Medida Provisória. O parlamento aprovou o fim do tal “voto de Minerva” em 2020 e é absolutamente constrangedor para os congressistas votarem de forma contrária nem três anos depois.
O Planalto, prevendo derrota, agiu. Fechou um acordo com a federação dos bancos, a Febraban, e a confederação da indústria, a CNI. Cedeu inclusive a um think tank de caráter lobista a missão de encontrar um consenso entre Executivo, Legislativo e iniciativa privada.
Haddad fala de tramitar uma Reforma Tributária sobre o consumo e a nova âncora fiscal — a qual não se sabe nem as bases da construção — no primeiro semestre. Hoje, porém, o líder do governo na Câmara, o deputado José Guimarães (PT), afirmou à Bloomberg que o ideal é a Reforma Tributária ampla, abarcando consumo e renda, e que a aprovação poderia acontecer até o fim do ano.
Aparentemente, Guimarães é o adulto na sala. A reforma sobre o consumo, baseada na PEC 45, enfrenta quase que intransponível resistência do setor de serviços — o com maior peso no PIB e o mais prejudicado pela criação do Imposto de Valor Agregado. Sem a migração da carga tributária do consumo para patrimônio e renda — o que obriga a discussão em conjunto de todo o arcabouço tributário —, não haverá reforma alguma.
Lula, por outro lado, não fala sobre a criação do IVA. Discursa apenas sobre mudanças no imposto de renda e aumento do salário-mínimo. Então, qual será a prioridade? Quando o Executivo começará a pressionar o Congresso para acelerar as tramitações, uma vez que ambas já estão em discussão — a PEC 45 na Câmara e uma sobre Imposto de Renda no Senado?
“Há muita especulação ainda. Só teremos certeza do que andará depois de os projetos serem apresentados”, afirmou o deputado Rubens Júnior (PT), vice-líder do governo na Câmara.
Ele foi sincero. Nem mesmo as lideranças do PT na casa sabem quais projetos serão apresentados primeiro e nem os seus teores.
*O conteúdo é de responsabilidade do colunista e não reflete o posicionamento do FLJ