Por Reuters
O padrão climático El Niño deve reduzir a geração da usina hidrelétrica de Belo Monte no início de 2024, bem como diminuir seu potencial exportável de energia elétrica para países vizinhos, disse à Reuters um executivo da Norte Energia, concessionária responsável pelo empreendimento.
A redução da geração da maior hidrelétrica 100% brasileira deve ocorrer com o prolongamento do El Niño causando menos chuvas na região Norte justamente no período em que Belo Monte explora mais sua capacidade.
A geração da usina, uma hidrelétrica a fio d’água, sem reservatório de acumulação de água, é normalmente mais forte no primeiro semestre, passando a cair drasticamente na segunda metade do ano devido à sazonalidade das vazões do Rio Xingu.
“Evidentemente que a gente espera no primeiro semestre que a nossa geração não seja tão boa quanto foi em 2021, 2022 e em 2023”, afirmou Franklin Miguel, diretor de Regulação e Comercialização da Norte Energia, que tem como sócias grandes empresas do setor, como Eletrobras, Cemig e Neoenergia, além de fundos de pensão e as empresas autoprodutoras de energia Vale e Sinobras.
“De forma consistente, a usina tem aumentado a produção dela. Agora, para o ano de 2024, se espera uma redução”, acrescentou, sem comentar números por entender que as estimativas ainda são “muito preliminares”.
Instalada no sudoeste do Pará, na Bacia do rio Amazonas, Belo Monte tem 11.233,1 megawatts (MW) de capacidade instalada, o que a coloca como a segunda maior usina do Brasil, atrás apenas de Itaipu Binacional.
Belo Monte é um ativo relevante para o Sistema Interligado Nacional (SIN), representando 6% de toda energia produzida, mas sua menor geração não acende um alerta tão grande para o país devido ao forte crescimento das usinas eólicas e solares, que têm sido operadas “na base” pelo operador.
A hidrelétrica normalmente produz muito na primeira metade do ano, mas chega a ficar com máquinas praticamente paradas no segundo semestre.
Essa lógica de operação chegou a ser alvo de críticas por alguns especialistas, que apontam os elevados custos enfrentados para se erguer o empreendimento, tanto do ponto de vista econômico quanto social e ambiental, pelo efeito sobre as comunidades que habitam a Volta Grande do Xingu.
No ano passado, a hidrelétrica fechou o ano batendo recorde de geração, alcançando 37.138 gigawatts-hora (GWh), 17% acima do registrado no ano anterior.
Segundo Miguel, os efeitos do El Niño devem afetar o vertimento turbinável, diminuindo assim o potencial de energia de Belo Monte que poderia ser exportada para países vizinhos.
“Todo ano, desde que a usina entrou em operação comercial, temos vertimento turbinável da ordem de 750 megawatts médios. Para 2024, por causa da hidrologia, pode ser reduzido para 300, 400 megawatts médios”.
O Brasil passou neste ano a aproveitar o vertimento turbinável das hidrelétricas, uma energia que antes era “desperdiçada”, para exportar para Argentina e Uruguai, tendo importantes ganhos financeiros com as operações.
De janeiro a agosto deste ano, a exportação de energia das hidrelétricas rendeu 781 milhões de reais para os geradores da fonte, segundo dados divulgados nesta semana pelo governo.
Os valores arrecadados com essas operações são rateados entre as todas usinas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), espécie de “condomínio” das hidrelétricas, criado para mitigar o risco de geração dessas usinas pelo compartilhamento de ônus e bônus.
“Estamos estimando… um resultado só de exportação para a Norte Energia em torno de 50 a 60 milhões de reais neste ano”, disse o executivo.
ALTA DE CUSTOS
Um terceiro impacto do El Niño já vem sendo sentido por Belo Monte e está associado à alta dos custos que a hidrelétrica tem com compras de energia neste segundo semestre, período em que sua geração é muito baixa e há necessidade de balancear o portfólio.
Segundo o diretor da Norte Energia, o padrão climático trouxe chuvas intensas no Sul e elevou a geração da usina de Itaipu. Com isso, a binacional tem alocado mais energia para o MRE — mecanismo no qual Belo Monte compra energia — a uma tarifa muito mais elevada se comparada a dos outros geradores hidrelétricos.
“Todas as outras usinas, quando colocam energia no MRE, recebem tarifa de 16 reais, exceto Itaipu, que coloca a 60 reais”, disse, explicando que essa tarifa, chamada “TEO Itaipu”, é mais cara devido a particularidades do empreendimento, como custos operacionais diferentes dos demais geradores.
“Nós compramos energia de todos os geradores (no MRE), mas tem um mix de Itaipu e dos outros, aí a tarifa que estamos comprando acaba ficando um pouquinho mais cara do que o previsto.”
Ele observou que a elevação dos “custos MRE” afeta especialmente Belo Monte em virtude de sua sazonalidade ser muito mais acentuada do que outras usinas que também passam por essa situação, como as do Rio Madeira.